quarta-feira, 28 de maio de 2014

segunda-feira, 26 de maio de 2014

Simplesmente GUERRA ! A operação "nó górdio"do século vinte e um!

Simplesmente GUERRA !
A operação "nó górdio"do século vinte e um!






.....apontamento sobre os "prós" dos "contra" a Liberdade, ou como se vive uma época de mistificação e manipulação !

Não é o facto de ter caído numa armadilha, ao ter aceite o convite para estar presente,no último programa da RTP "prós e contras" que me obriga a este apontamento. É um desabafo e uma preocupação, sobre como no mundo de hoje é fácil para alguns mentir e branquear e para outros dialogar,apresentar elementos históricos provados e até poderem explicar com serenidade as causas da distorção,do erro, do engano ou maldade alheia.

O desabafo: 

O formato e condução do programa não são sérios.Não vale a pena o eufemismo de referir isenção ou neutralidade,porque há muito esses princípios andam arredados de muito jornalismo escrito, falado ou televisionado!

Quem viu o programa,em causa,do passado dia 15 de Outubro terá constatado o favoritismo escandaloso entre, não só, o nº dos escolhidos ou convidados "pró-guerra" e os de opinião contrária,como o tempo de antena dado a uns e o retirado (ou não dado a outros) pela moderadora (!?).

É preciso ter nervos de aço ou ser profissional da manipulação (ignorante) para não se ficar perturbado ao ouvir tanta distorção histórica,por parte de intervenientes zangados com o 25 de Abril e até ouvir um Embaixador,como o da Guiné-Bissau" reduzir o massacre das docas de Pidjiguiti (em Junho de 1959) em Bissau a uma mera reivindicação laboral. Não sabia que um dos principais activistas tinha sido Carlos Correia (mais tarde Ministro das Finanças e Primeiro Ministro),então trabalhador da Casa Gouveia (...não é nome que esqueça a um guineense com estas responsabilidades...) e ainda fui eu que (sentado próximo do Sr.Embaixador,tive de lhe servir de "muleta",ao sussurrar-lhe o nome desse" homem grande" e activista dessa greve,pessoa humilde,íntegra e patriota com quem tive o gosto de trabalhar e conviver durante dez anos de Cooperação em Bissau (desde o final dos anos 70 até ao dos anos 80).

Quem é que escolheu esta personagem? Este Sr.Embaixador que não sabe que Pidjiguiti representa mais de 50 mortos, de uma centena de feridos,dos sobreviventes deportados para S.Tomé,e que um mês e meio após este acontecimento ("apenas laboral" no dizer do Sr,representante de Bissau),,já com Carlos Correia (e outros que conseguiram fugir) e juntar-se aos nacionalistas, comandados por Amilcar Cabral, a Direcção do PAIGC( ainda só P.A.I.=Partido Africano para Independência)abandonou a «acção política e social» e declarou -se a favor da luta conta o colonialismo português «por todos os meios possíveis incluindo o da luta armada».Lê-se em declarações de Amilcar Cabral «a luta armada era a única resposta à força das armas e a acção não deveria ser desencadeada nas cidades...mas antes privilegiar a força camponesa » E foi o que aconteceu com escolas de formação, para quadros políticos, instaladas junto da Direcção política,no vizinho país, em Conakry.

«O ensino militar que vocês receberam,as armas que os colonialistas vos deram para matar a nossa gente,o material de guerra e as munições que estão em quartéis à vossa guarda.tudo isso pode ser posto ao serviço da luta de libertação dos nossos povos.Estamos seguros de que é o que vocês vão fazer,com prudência,com cuidado e inteligência...»mensagem de Amilcar Cabral, em Outubro de 1960. com o seu pseudónimo de Abel Djassi.

Numa outra mensagem aos colonos portugueses,Cabral avisa, «...o colonialismo português tem os dias contados e vós sabeis isso muito bem.não deveis consentir,como homens conscientes,no absurdo de amarrar o vosso destino ao destino do colonialismo português....»

Ainda em 15 de Novembro o P.A.I. dirige-se ao governo português num memorando:« a via pela qual vai ser feita a liquidação total do colonialismo português...depende exclusivamente do governo português.(...) Ainda não é tarde para proceder à liquidação pacífica da dominação colonial portuguesa nas nossas terras.A menos que o governo português queira arrastar o povo de Portugal para o desastre de uma guerra colonial».

Não adivinhava Amílcar Cabral que esta característica de negociador (verdadeira ou insinuada) lhe iria ser fatal.Da facção militar guerrilheira,mais ortodoxa,sedenta de Poder,iria sair o plano para o matar em Janeiro de 1973,instigados ou não pelo boato, lançado pelas hostes Spinolístas,de que ele, A,Cabral e Aristides Menezes, queriam ou teriam querido negociar.

A preocupação

Acrescento uma preocupação sobre os episódios que estão a passar, na RTP 1, sobre a Guerra(do Ultramar,Colonial ou de Libertação...ai.... a semântica e a dificuldade de passados 33 anos ainda haver quem tenha medo de chamar "os bois pelos nomes!!!"

Espero que a frase do Joaquim Furtado,que tenho como um profissional sério e íntegro, (na apresentação da síntese dos nove primeiros episódios,a que alguns de nós assistimos na própria RTP,na tarde de 15 p.p. " ...de ter procurado, na realização dos filmes, não ferir susceptibilidades..." não resvale, no receio de magoar os responsáveis (quer da altura quer os seus correligionários actuais) exactamente aqueles que nos atiraram para aquela desgraça de treze (ou mais anos) e que ainda tentem "desonrar" o nosso 25 de Abril...como lastimávelmente esteve à beira de acontecer no famigerado programa dos "Prós e Contras" da passada segunda feira,com a convergência dos factores já descritos no meu desabafo.

Entre os dislates ouvidos de saudosistas e conservadores ignorantes, destaco um que nos diz especial respeito. Alguém pretendeu por em causa a honorabilidade do nosso 25 de Abril,procurando apagar as suas verdadeiras razões para justificar a sua argumentação "revanchista" e falsa,com o argumento ,de que só se fez o 25 de Abril por uma questão corporativa,por causa do Dec.Lei 353/73...

Ora...Quantos de nós, já antes do decreto, havíamos começado a sentir a necessidade de acabar com a impostura ???

Lembro-me do desabafo, já em Nacala/Moçambique(1970) no navio Niassa, quando cerca de dez capitães,que eu já tinha visto passar por Nampula,acabados os mais de dois anos de guerra colonial, preparados para regressar a Lisboa, são forçados a interromper tal esperança e chamados (por Kaúlza) a regressar "ao mato" para integrarem a Operação "Nó Górdio"... perante o meu espanto, exclamaram:

TEMOS DE ACABAR COM ISTO, ANDAM A GOZAR CONNOSCO ...!!! 

Lembro-me dos capitães que a partir de 1965, e particularmente após Maio de 1968, começam a informar-se mais e a dialogar melhor com a sociedade civil e com os alferes milicianos,enquadrando nas suas consciências as contradições do Regime,das revoltas abafadas desde 1927 até 1961,Chaves,Porto,Lisboa,Madeira,Beja.Das personagens Norton de Matos,Sousa Dias, H.Delgado, H.Galvão, e tantos outros....Da efectiva mentira e da ficção do Grande Império (perdido a partir de 1580, mais perdido ainda depois de 1820 (Brasil),praticamente nas mãos da estratégia dos Ingleses,já desde 1640 - como paga da aliança primeiro contra Castelhanos e depois contra Franceses - e mais acentuadamente,a partir do século dezanove,proibindo o "mapa cor de rosa" e escoando e coordenando a exploração dos minerais, café, chocolate, chá...algodão, tabaco...portos e caminhos de ferro...etc...deixando "umas sobras para português ver" a algumas famílias nacionais,tudo isto com a benevolência dos nossos Ministros da Colónias e outras dignas altas esferas ).Lembram-se que em Moçambique até o trânsito se fazia pela faixa esquerda como no Reino -Unido???

Império sem gente,sem poder,sem motivação desenvolvimentista,sem meios materiais e sequer bélicos!!! É o que se encontra no principio do século vinte,antes das ditas "guerras da pacificação"(1920/1930).

Timor -Leste, pouca gente se lembra esteve nas mãos do Japão /Austrália, mais de quatro anos de 1941 a 1945 .
Pouco ou nada muda até o pós Segunda Grande Guerra.

As fronteiras das colónias são então demarcadas.A Casamança,dita portuguesa, na Guiné,passa para o Senegal, é trocada por uma parcela de pedras,a Leste, perto de Konakry,por despacho dum alto dirigente português a troco dum bairro em Paris.

Os países coloniais começam a resolver politicamente as inevitáveis descolonizações.

As "nossas" parcelas da Índia são defendidas com "chouriços" e não fora o bom senso de Vassalo e Silva teria havido um massacre inenarrável.Efectivamente nem armas havia e quando alguns caixotes são abertos,felizmente são mesmo chouriços e outros produtos congéneres que se encontram.Conta quem lá esteve.

A Guiné estava numa mão da CUF(Casa Gouveia) e o seu povo na miséria continuava.As riquezas exploradas,mancarra,arroz e cajú não davam para fazer escolas,hospitais,estradas,etc.O desenvolvimento era nulo.(Estive lá, antes e depois da Independência)

Cabo-Verde tinha metade da população emigrante!(igualmente conheci, antes e depois da Independência)

S.Tomé e Príncipe vivia de "escravos" que alimentavam as roças dos senhores.Sendo das terras mais bonitas que já alguma vez conheci (estive lá em 1962) nem sequer as riquezas do café ao cacau e frutas serviram para desenvolver.E o Turismo tinha a desculpa do paludismo e do clima equatorial.!!!! Leia-se o livro o "Equador" de M.S.Tavares e já entenderão porque é bom não esquecer os nosso velhos "aliados ingleses"e um pouco do que era a realidade,agora ficcionada pelos saudosistas.


Era este o Império onde em Angola (14 vezes maior que Portugal) em 1960 havia 1.500 militares portugueses e cerca de 5.000 africanos integrados.Onde o desenvolvimento à semelhança de Moçambique (nunca sustentado nem coerente com as potencialidades naturais), começou a dinamizar-se com o inicio da Guerra Colonial.Era preciso autorização do Terreiro do Paço para tudo e para nada,com medo da independência Branca e Unilateral.Também conheci estas duas colónias antes e depois das suas Independências.Até para uma "barragem agrícola" era preciso licença de Lisboa...assisti a isso.

Os capitães, da geração do 25 de Abril, foram sabendo isto e muito mais,nas três frentes de combate.As grandes potências tinham ou estavam a perder as guerras semelhantes (Indochina,Argélia,Vietname)e a célebre APSIC(acção psicológica) colocou o capitão muito próximo do então "terrorista".Na quadrícula,o capitão não era só chefe militar no terreno, era uma personagem com um vasto leque de missões de carácter civil.Nesse entrosamento apreendeu e aprendeu que o verdadeiro inimigo estava no Terreiro do Paço.Viu de perto, durante excessivo tempo,o que certos saudosistas, já não inebriados "com a cruz e a espada contra o sarraceno" não quiseram ver porque não arrancaram a armadura vestida nos quartéis(antigos conventos) e talhada com atributos "moralizadores,pedagógicos e cívicos" para o cumprimento de missões transcendentes ,defender uma legalidade constitucional e garantir a independência da Nação, una e indivisível.Isso substituiu o que se perdeu de "teológico"(a cruz e a espada) .Há que compreender que o " velho" militar, que tal assimilou, dificilmente possa desconstruir em si esta assimilação,sentimento, dinâmica ou vulgo "lavagem ao cérebro".A culpa não terá sido sua mas do sistema.Quase me arriscava a solicitar a condescendência..

Lembro-me de capitães e primeiros-tenentes que encontrei no Congresso do MDP/CDE em Aveiro, em Março de 1973, e dos que já antes se interrogavam, na hipótese de acção, mesmo em 1969.

Lembro-me de ter chegado a Bissau,por castigo,e de ter começado,no dia seguinte, com outros capitães,a conspirar, sem saber da existência de Decreto nenhum.Não vou negar hoje que a saída deste célebre 353/73 nos deu jeito,mas como é que ele era corporativo se só dizia respeito às Armas de Infantaria,Cavalaria e Artilharia? Foram só os capitães destas que se revoltaram?Claro que não.
Desde logo se solidarizaram outros capitães e equivalentes de outros Ramos da FFAAs.Capitães de Engenharia, Administração, Transmissões,Saúde,Material,etc...e da Marinha e Força Aérea, no sentido de em conjunto se aprofundar o que estava em causa.
E o que estava em causa?
Uma Guerra perdida politicamente,porque os políticos não estavam nem com os ventos da História nem com o povo (e deste nós, os militares de carreira, com duas,três ou mais comissões,fora do ar condicionado, cansados da mentira e da hipocrisia ...e bem assim os conscritos desmotivados e acomodados)

Enfim muito para dizer e que já é repetição.Mas as novas gerações merecem a Verdade.

Citando Alexis de Tocqville convém não esquecer que "as revoluções que triunfam fazem desaparecer as causas que as produziram e tornam-se por isso incompreensíveis para as novas gerações".

Isto para dizer que se assim for e se os episódios de Joaquim Furtado se remeterem apenas ao seu profissionalismo de contar uma «história» sem o devido enquadramento Histórico, ou seja se estiver em perigo essa Verdade e ousar-se o branqueamento do trágico erro Histórico que foi a Guerra Colonial e da ficção do Grande Império, julgo que a A25A não pode ficar calada.

É uma especulação académica,um exercício de estilo,discutir se foi Guerra do Ultramar,Guerra Colonial ou Guerra da Libertação.

Para mim foi guerra Colonial.Mas o mais importante é que foi uma guerra ordenada e mantida por um governo retrógrado, liderada por um chefe rural e retrógrado que tão mal fez a Portugal...cujos efeitos nefastos ainda hoje se sentem.

Os povos em confronto ganharam a guerra da Liberdade...mas ainda não ganhámos (lá e cá) a Guerra da Igualdade e da Fraternidade.

É aí que está um verdadeiro "NÓ GÓRDIO do século XXI.

Manuel Duran Clemente

sábado, 24 de maio de 2014

João Varela Gomes 90 anos,muitos amigos

João Varela Gomes   
90 anos,muitos amigos
“Semente do nosso Abril, germinando o cravo, Revolução”.


















Camarada,companheiro,comandante
Querido Amigo


É “preciso tempo para nos tornarmos jovens”, alguém disse. Pois apesar dos teus 90 anos que hoje comemoramos continuas viçoso guerreiro, militante por uma sociedade igualitária e justa.Sempre o foste esse cavaleiro empunhando a lâmina da tua espada, com a dimensão plana do nosso Alentejo e o seu punho representando a cruz das gentes sofridas, na elevação da sua dignidade, tão profusamente por ti defendida!
Submissão,nunca.Nunca soubeste o que é.

Foste sempre aquele/ que nos mostrou/a urgência do sonho…e a liberdade.

Camarada,companheiro,comandante.
Querido Amigo.

“Semente do nosso Abril,germinando cravos,Revolução”.É a tua vida.
Falar dela? Como?Se ela fala por ti.
É a vossa vida: Maria Eugénia e João Varela Gomes.Indissosiáveis.Vidas que falam por vós.
Nas batalhas que ambos travaram, na dor e sofrimento,anos e anos, na incansável e indestrutível missão de libertar Portugal do fascismo e do árduo combate aos ímpetos retrógrados e saudosistas para dignificação das suas gentes agrilhoadas.
Mas vamos a alguns factos relevantes.Depois de terem trabalhado afincadamente na candidatura de Humberto Delgado em 1958, João Varela Gomes e Maria Eugénia (esta,  fazendo a ligação entre militares e civis) estiveram profundamente ligados à conspiração da Sé em 1959.
Precedendo, os acontecimentos de Beja, em 1961, o então Capitão Varela Gomes e outros oposicionistas, promovem uma candidatura para deputados à então Assembleia Nacional.Pela forma hábil,como fez o pedido,Varela Gomes foi curiosamente autorizada pelo próprio ditador. Na campanha, entre os empolgantes comícios realizados no distrito de Lisboa, ficou célebre o comício realizado no Teatro da Trindade, onde com toda a sua coragem e frontalidade incentivou os presentes à revolta, levando-os ao rubro.
No no final desse ano João Varela Gomes foi o comandante militar no histórico assalto ao quartel de Beja, na noite de passagem para o ano de 1962.Ferido gravemente, a acção revolucionária não teve êxito. Entre a vida e a morte saiu vitorioso. Só seria julgado dois anos depois, não em Tribunal Militar, mas no “tristemente célebre Plenário”, Tribunal da Boa Hora ( primeiro caso na história da instituição militar). No seu julgamento, faz um depoimento (previamente decorado) que só por si o define como um homem de invulgar integridade e de amor à sua causa.Contra a vontade do seu advogado,como disse Maria Eugénia em entrevista: «ele foi para tribunal instigar que outros fizessem o que eles tinham feito. Instigar à revolta. E falou de Salazar de uma maneira que nem queiram saber…foi uma coisa de arromba!» Condenado a seis anos de prisão maior, quiseram lhe impor a lei especial, de contar por metade o tempo de reclusão anterior/preventiva.  Face aos apelos e perante a visita do Papa, em 1967,acabaria por ser alterada esta disposição.A sentença é cumprida: três anos, entre a Penitenciária e o Aljube (em Lisboa) - sempre isolado, sempre vigiado - e os restantes três no Forte de Peniche. Nesse julgamento, a seu lado, como ré, esteve também Maria Eugénia, condenada a 18 meses, que já cumprira, na prisão de Caxias, onde,instigada a denunciar, resistiu estóicamente:  à tortura de sono, na sede da PIDE,e de imediato a três meses de isolamento, na referida prisão.Nunca falou.
João Varela Gomes, no forte de Peniche, onde esteve três anos, diz ter recebido dos seus companheiros de prisão o melhor acolhimento ao que correspondeu com uma profunda admiração e enorme respeito por eles. Sempre os viu como homens sérios,cultos e empenhados na mesma luta  e a padecer por ideais.Saiu de Peniche em 1968,recebido pelos seus - mulher e filhos – no amanhecer dum dia especial. Diz Maria Eugénia que lhe viu “verter algumas lágrimas de comoção. Não era possível sair dali, dignamente, deixando atrás de nós tanta gente a penar em condições duríssimas.”
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Iniciam nova fase.Com quatro filhos menores. Tiveram a solidariedade de muitos e as dificuldades inerentes de sustentar um família não pequena.Proibido de actividade política, João varela Gomes vê Maria Eugénia encarregar-se dessa acção. Activista na Frente Patriótica de Libertação Nacional e  na Comissão Nacional de Socorro aos Presos Políticos. A sua acção foi sempre de enorme empenhamento e elevado dinamismo. Tendo participado na campanha eleitoral da CDE em 1969, é presa pela PIDE durante uma semana, apenas por estar à procura dos filhos numa manifestação.
Durante o ano de 1973  vêem os seus filhos ser presos pela PIDE: o Paulo, com 20 anos, por um mês, por causa do 1º de Maio, as filhas de 16 e 17 anos, durante uma semana, além de uma delas (a mais nova) com a mãe serem espancadas pela polícia de choque, num comício de campanha eleitoral na S.N.B.A. 
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A história de todo o cidadão - como João Varela Gomes – homem e militar feito de frontalidade e empenho na acção, de coragem, de honestidade intelectual e de dignidade de carácter…de não quebrar, nem torcer -não fica por aqui.
Chegados ao 25 de Abril de 1974 João Varela Gomes é reintegrado, no Exército, com posto de Coronel.
Também aquilo que tinha vivido,sofrido e proclamado -a incitação à revolta- terá sido ouvido pelos capitães. Também as lutas antifascistas fizeram parte da aprendizagem dos capitães de Abril.
“Sementes do nosso Abril,germinando cravos,Revolução”.
Logo nos primeiros dias de Liberdade recebendo ordens por escrito, de Rosa Coutinho, para coordenar o desmantelamento da Legião Portuguesa.Nem começou a missão. O farisaico, membro da JSN, Jaime Silvério Marques ,estupefactamente, manda-o prender !!!Começavam as contradições no seio do MFA e logo tinha de atingir este alvo. Ainda fez o passeio até à Trafaria .Não se consumou a prisão.Os capitães actuaram e Dinis de Almeida trouxe-o de regresso.
Foi então criada em Junho, na Chefia do Estado Maio General das FFAAs, a 5ª Divisão, com o fim imediato de integrar os sete oficiais que constituíam a 1ª Comissão Coordenadora do Programa do MFA. Vasco Gonçalves foi o seu primeiro chefe por apenas um mês, porque toma conta do II Governo Provisório a 18 de Julho. Dentro do EMGFA o Coronel Varela Gomes transitara para esta nova 5ª Divisão. Como oficial de maior patente é Varela Gomes que assume, entre Julho e Outubro “oficiosamente” o lugar de  chefe desta Divisão, seguindo-se lhe o Coronel Robin de Andrade e, mais tarde, o Comandante Ramiro Correia,  que desde Outubro de 1974, já na 5ª Divisão, coordenava e impulsionava as Campanhas de Dinamização Cultural.
Nos seus 14 meses de permanência, nesta estrutura,Varela Gomes, tem particular relevância, não só no período  em que está à frente da 5ª Divisão, na organização e coordenação dos seus diversos sectores, como depois,segunda figura hierárquica,vincando com a sua acção a marca do militar “intransigente na defesa dos ideais de Abril e na defesa da Revolução”.
Alguns de nós militares ou ex-militares ,aqui presentes, somos testemunhas vivas dessa sua pujança e  seu dinamismo. Lá estava, sempre no seu “posto de missão”. E quando necessário, nos momentos mais delicados do período revolucionário, a sua intervenção e a da 5ª Divisão revelaram-se essenciais.Peculiar em defesa de Abril e contra os inimigos deste.Aconteceu no 28 de Setembro, no 11 de Março e no chamado Verão Quente…ou, mesmo ainda, no próprio, 25 de Novembro! Mas convirá ouvir o que ,de seu próprio punho, João Varela Gomes escreveu no preâmbulo do Livro Branco da 5ª Divisão, editado em 1984:
“…a 5ª Divisão foi um autêntico órgão revolucionário. …O mérito que porventura houve foi o de, observando o fluir do movimento popular, tentar assegurá-lo, defendê-lo, integrá-lo ao nível do poder militar.”
“…militares de carreira ou em serviço temporário; sargentos, soldados e marinheiros; funcionários civis; trabalhadores voluntários; intelectuais e artistas; dedicações sem número; foram centenas, mais de mil, quantos fizeram a 5ªDivisão e contribuíram para lhe moldar a sua singular feição revolucionária… resoluta, como marcha para o combate ...”
“ …em igual medida, as centrais de desestabilização imperialistas nos distinguiram como alvo a destruir. Prioritário. O mais perigoso. Essa distinção a assumimos. Como título de honra. De tão elevada quota no quadro dos valores revolucionários que, em sincera modéstia, a achamos imerecida.” (Citámos).
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Sabemos como as Revoluções -  povo na rua e trabalhadores participativos, com a esperança renascida num melhor futuro, empenhados e mais felizes - são insuportáveis e intoleráveis para a burguesia e suas elites acomodadas, sedentas de poder que logo se apressam a considerá-las – como a bagunça na rua, a populaça efusiva, o desvario…mas muito (sobretudo) os seus haveres e privilégios em risco.
Os nossos 19 meses (ou 500 dias)  de período revolucionário, tão caluniado pelos seus inimigos, são um dos tempos mais belos e ricos da nossa história. É Varela Gomes quem o escreve  “a gloriosa Revolução dos Cravos é nossa, é de esquerda, é do povo trabalhador, das pessoas decentes, honestas, cultas. Luta por um melhor futuro para os desfavorecidos, por nascimento ou condição social.Não tem quaisquer afinidades com as minorias exploradoras, nem com os desfrutadores de privilégios abusivos, nem com fascistas ou filofascistas.”…” Mas não deixa de ser curioso que  até uma «troika», no final de 1975, tenha lavrado um relatório (agora perdido!?) declarando o estado de boa saúde económico/ financeira de Portugal” (Citámos).
Paradoxalmente, ou não, esse período contém em si toda a dialéctica reaccionária de contra-revolução. João V.Gomes apercebeu-se disso muito cedo e daí o seu combate e tentativa de evitar que esta singrasse. Infelizmente a contra-revolução venceu. Terá começado, tímida, travestida. Hoje, e há muito tempo, já se  passeia engalanada e arrogante.
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Por isso, a saga do nosso aniversariante e homenageado continua.
É sujeito a um mandato de captura,para se entregar, emitido pelos vencedores do 25 de Novembro, na qual se apela à própria população para denunciar o coronel Varela Gomes e outros militares. Porque que crime?
O crime, esse, fizeram-no os fautores do Novembro da nossa Primavera. Feito com planeamento e ordens de missão contra a Revolução. Não foi um golpe contra um golpe, como lhes soa bem, justificar. Foi um golpe contra a Revolução concretizado pelos que, se deixaram seduzir, com maior ou menos grau de percepção, pelo aparente sossego duma ilusória tranquilidade de um regime democrático doente, em que o povo já não é quem mais ordena.
De acordo com os ditames da sua consciência, Varela Gomes e outros militares (*), não tinham motivos para se entregarem ao “restauracionado” novo poder.Tornam-se exilados políticos da democracia de Abril.
Começa uma nova etapa na vida deste  lutador (novamente acompanhado de Maria Eugénia). Foi assim durante quatro anos, primeiro em Angola, onde, ainda teve a desventura de assistir à injusta prisão do saudoso e inocente, camarada e companheiro, Costa Martins. Depois em Moçambique, onde, para maior desgosto viveu, também, a trágica morte  (por acidente) do não menos saudoso, camarada e companheiro, Ramiro Correia, com sua mulher e um dos filhos.
Foi assim “Subitamente, na clivagem do tempo”, (para utilizar o título de um poema deste), em cenário de tragédia antiquíssima, solene, tão tremenda… que jamais a emoção deixará o entendimento esquecer.
Regressou a Portugal em 1979.Nunca foi julgado, não obstante ter-lhe sido aplicada (a si e outros militares) a pena, administrativa e ilegal, de passagem ao quadro de complemento (a miliciano?!). O Tribunal Superior Administrativo demorou cinco anos para anular semelhante aberração. Foi integrado, não sem peripécias grotescas, em 1982, como Coronel mas Reformado!
Camarada,companheiro,comandante.João Varela Gomes
Querido Amigo.
Nasceste a 24 de Maio de 1924. Uma vida cheia de anos, noventa anos cheios de vida.Citando alguém que te faz justiça  diremos: “De uma vida que escolheu o caminho da coragem e da dignidade, ontem contra o fascismo, hoje contra a quietude endémica, a indiferença e o cepticismo político e ideológico de uma democracia que não hesitas em chamar filofascista. Com uma independência e uma frontalidade a toda a prova, continuas o combate solitário, quase quixotesco, através de textos livres, indignados, provocatórios, que teimam em furar o cordão sanitário do politicamente correcto, da aceitação passiva de que não há alternativa. Como este, que em jeito de homenagem aqui reproduzimos:”

«Mitos do Séc. XX – A Democracia»
«Mito que remonta à governação de Atenas Cidade, já lá vão 2500 anos»
« Mito ressuscitado no sec. XVIII da era de Cristo pela emergente classe burguesa. Os amigos de Péricles ressurrectos: les gens de bien, gente que tinha alguma coisa a perder. Mito que ficou consubstanciado na Constituição dos EUA de 1777, nos ideais da Revolução Francesa, no poder político exercido pela burguesia de então.»
«Assim, sim, exclamaram os crédulos. Agora acabaram os abusos e privilégios da nobreza e do clero, o poder será legitimado pelo povo em eleições, os mais aptos, ilustrados e honestos desempenharão os cargos públicos que nunca mais serão ocupados por favoritismo, razões de riqueza ou nascimento. Liberdade, Igualdade, Fraternidade. O mundo civilizado convertido numa grande, feliz e próspera Atenas.» 
«Em Portugal, o mito da democracia também é fruto da época. Constituição de 1820, vitória liberal, etc. Habitou os sonhos dos antifascistas neste século a findar, durante os cinquenta anos salazarentos. Veio o 25 de Abril. E vieram ao assalto o Soares, seus pares e outros exemplares. A desilusão é cruel.»
«Pelo mundo fora os créditos do sistema democrático também estão pelas ruas da amargura. O espertalhão de serviço cita Churchill (ou lá quem for): «A democracia é o pior dos regimes, à excepção de todos os outros».
«Assim sossegam a consciência para mais demagogia, mais entorses, promessas de socorrer os pobres e desfavorecidos. Uma rábula de tal maneira desacreditada, que leva meio eleitorado a abster-se de votar. O modelo democrático, tal como está implantado no chamado mundo ocidental e vai sendo imposto aos países menos desenvolvidos, constitui uma máquina bem oleada (lubrificada a dinheiro) para o exercício do poder absoluto da burguesia capitalista. Embora o funcionamento do sistema tenha vindo a degradar-se. A ferrugem – isto é, a corrupção – aparece a todos os níveis. O modelo está esgotado, dizem uns. Está apodrecido, diz a voz do povo. Mas não, dizem eles. Bastam uma reformazinhas, um rendimento mínimo, um torneio de futebol. Dêem-nos ideias, dêem-nos ideias.»
«Perante a falência do equilíbrio triangular, o sistema finge acreditar num 4º poder fiscalizador: a imprensa. Agora englobando todos os modernos veículos da comunicação social, incluindo a recentíssima Internet. Ora, todo o mundo sabe como os grandes capitalistas se apoderaram dos meios de comunicação e informação à escala planetária. A propaganda imperialista, a defesa dos interesses do capital cobre todo o globo, atinge o mais remoto povoado nas montanhas. Os noticiários em todos os países de todos os continentes abrem com a devida vénia às iniciativas americanas, às actividades dos ícones da burguesia. Era a BBC, agora é a CNN a referência universal. A aldeia global vem a revelar o mesmo espírito que a aldeia paroquial. A imprensa livre, a expressão independente da opinião, fica relegada para uma situação de semiclandestinidade. O quarto poder está escravizado pelo poder capitalista. Mais um mito que se esvai.(…)» “Esta Democracia filofascista”  de João Varela Gomes,edição de autor.


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Esta tem sido outra tua forma de luta nos últimos trinta anos, publicando livros e artigos, divulgando, esclarecendo, desmascarando, vincando sempre as tuas imorredouras características de cáustico, mas tenaz e sério, combatente da liberdade.
Fomos mais longe do que nos tínhamos comprometido.
Exigência da personagem do homenageado. Exigência dos tempos actuais. Efectivamente a contra-revolução, de braço dado com o sistema neo-liberal global, entrou no nosso processo como um vírus, tem-se instalado no propósito de destruir as nossas conquistas de Abril, as nossas conquistas da Revolução…De tal sorte, passados 40  anos, estaremos estupefactos. Como foi possível isto ???E como bem dizes “Neste 40º aniversário – em ano de angústia e empobrecimento para milhões de portugueses – impõe-se desfazer o equívoco/mistificação criado pela  farsa das cerimónias oficiais de homenagem ao 25 de Abril. Qual 25 de Abril? »Aquele que foi destruído....pela raiva contra-revolucionária em 25 Novembro 1975? Haja respeito por uma das páginas mais admiráveis na história do Povo de Portugal”
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Obrigado João Varela Gomes pelo exemplo,mais um, que só pode revigorar a nossa coragem em prosseguir a Luta. A luta em que hoje, os trabalhadores, a juventude, as mulheres e homens de Abril, vão continuar a travar contra os que pretendem restaurar um caduco e tenebroso passado.

No poema “Destino” do livro “Horas de Vidro” de Urbano Tavares Rodrigues,este diz o que se aplica inteiramente a ti «Trago na fonte/e estrela do fogo/da minha revolta/Nunca aceitaria qualquer tirania/nem a do dinheiro/nem a do mais justo ditador/nem a própria vida eu aceito.../tal como ela é/com todas as promessas/do amor e da juventude/e a parda doença/de envelhecer/a morte em cada dia/antecipada. Na mais lebrega alfurja/ou na cama de folhas macias/da floresta/da onde a chuva te adormeceu/há sempre um idamente de sol/cujos raios te penetram de/ventura/ao sonhares a palavra/liberdade.»

Parabéns João e Maria Eugénia.
Parabéns Paulo,Geninha, Maria da Luz e João António(lá onde estejas) por serem filhos de quem sois.
Parabéns André,Pedro,Rita ,João e Tiago por serem netos de quem sois.
Parabéns Maria e Rafael por serem bisnetos de quem sois.
Parabéns a todos nós por nos aceitares teus Amigos!

Sabemos como, na tua vida, te marcou o AMOR na acção,criação e perca.
Mas nessas lutas-com derrotas e vitórias- foste sempre de corpo inteiro. É aí que, na nossa memória, tu-Amigo João- já ascendeste  à eternidade e à imortalidade. Na memória dos que quiseste que fossem teus queridos e teus amigos, na memória das tuas acções e da tua obra, no desempenho pelo cimentar do nosso Abril da Liberdade.


Manuel Duran Clemente             24 de Maio de 2014 

(*) Saíram juntos ,em 9 de Janeiro de 1976, para Espanha a caminho do exílio em Madrid ,depois Havana e mais tarde em Luanda : Varela Gomes,Costa Martins e Duran Clemente.Aí encontraram mais militares refugiados.


sábado, 3 de maio de 2014

” 25 DE ABRIL, há 40 anos… e hoje”







” 25 DE ABRIL, há 40 anos…”

“…queríamos ser Livres, ter Paz, contribuir, com plena cidadania, para a construção do nosso futuro.”
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No momento em que comemoramos o 40º aniversário do Dia da Liberdade, passo decisivo para a Revolução de Abril e para as suas conquistas históricas - que transformaram profunda e positivamente Portugal e constituíram a matriz da democracia mais avançada alguma vez existente no nosso País,


 saudamos fraternalmente,   
                                                 
todos os militares de Abril (oficiais, sargentos, praças e milicianos) que, na madrugada do dia 25 de Abril de 1974, dando sequência à longa resistência ao regime fascista, o derrubaram e restituíram a liberdade aos portugueses, pondo fim a quase meio século de opressão e repressão;
o movimento de resistentes e opositores antifascistas , incansáveis lutadores pela liberdade (alguns dos quais encontrando a morte), durante mais de quatro décadas;


e ao longo destes 40 anos que celebramos:

saudamos também:

o movimento operário e popular que, em aliança com o MFA, liquidou o regime fascista e os seus sustentáculos essenciais – os grande grupos monopolistas e os latifundiários –pondo a riqueza e a produção nacionais ao serviço dos interesses dos trabalhadores, do povo e de Portugal;

os governos provisórios, que tiveram como preocupação maior, nas políticas que executaram, o bem-estar dos trabalhadores e do povo –   em especial, os governos que tiveram à sua frente aquele que foi o único primeiro-ministro, até hoje, a identificar-se totalmente com os interesses de Portugal e da imensa maioria dos portugueses: o General Vasco Gonçalves, o eternamente lembrado Companheiro Vasco”;

o poder local democrático uma das mais significativas conquistas de Abril e um dos profícuos baluartes da participação do povo na Democracia real.

os deputados da Assembleia Constituinte que estoicamente lutaram para consagrar as conquistas da revolução na Constituição da República Portuguesa de 1976;

os trabalhadores que, nos últimos 38 anos, com grande coragem e determinação, têm feito frente à ofensiva das política de direita e das politicas neoliberais do grande capital contra Abril;

os jovens - a pensar nos quais nasceu o projecto de futuro que foi a Revolução de Abril -  dos quais depende em muito o futuro de Portugal e que  hoje constituem as primeiras vítimas da política anti-Abril das troikas;

os idosos e reformados que o actual poder transformou em alvo a abater na sua senda da quebra da coesão social e do empobrecimento geral do país;

as mulheres e  homens  que, de Norte a Sul do País, em iniciativas do mais diverso tipo, participam nas Comemorações Populares e assumem com essa participação o compromisso de prosseguir a luta pelos ideais e valores da Revolução de Abril.
                                                 
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Houve 25 de Abril porque havendo ditadura, guerra, colonização, opressão, isolamento, obscurantismo, demagogia, um pesado policiamento das consciências, queríamos ser Livres, ter Paz, contribuir, com plena cidadania, para a construção do nosso futuro.
Os capitães, os militares, anos após anos, foram descobrindo que o inimigo não estava na mata tropical mas no Terreiro do Paço. Altas patentes militares e Governantes mentiam sem pudor. Paradoxalmente foi com a experiência da guerra, que souberam preparar com profissionalismo e competência a tomada do poder.
Há 40 anos Portugal redimiu-se numa noite e fez surpreendentemente, dum conjunto de jovens militares, emergirem capitães, timoneiros do povo armado e sob a égide dum povo unido erguer a mais bela das alvoradas, ponto de partida para a Revolução, para um processo revolucionário que, na base da aliança Povo/MFA, viria a produzir as profundas transformações económicas, sociais, políticas e culturais que dariam origem à Democracia de Abril, consagrada na Constituição da República Portuguesa de 2 de Abril de 1976.
A Revolução de Abril, ao pôr fim à ditadura fascista, abriu o caminho à participação dos cidadãos na vida pública, ao desenvolvimento económico, social e cultural dizendo não ao oportunismo, à corrupção, aos interesses ilegítimos dos grupos financeiros e sim à justiça social, ao direito ao trabalho, ao emprego, à saúde, à educação, à habitação, à paz, a mais futuro.
O processo revolucionário foi um dos períodos mais belos e criativos da nossa história. As conquistas de Abril, entre o democratizar, descolonizar e desenvolver, preconizadas pelo Programa do MFA e aprofundadas pela aliança Povo-MFA, foram formalizadas por mais de duzentos diplomas legais, entre 1974 e 1976. (1)
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Pergunta-se, mas o que é que festejamos , nesta data?
As Conquistas da Revolução – conquistas políticas, económicas, sociais, culturais, civilizacionais – conduziram, desde logo, a significativas melhorias das condições de trabalho e de vida dos trabalhadores e do povo e à definição de um projecto de progresso e desenvolvimento para Portugal. A par das liberdades democráticas – estas conquistadas pelo povo, nas ruas, através do seu exercício - o estabelecimento imediato do salário mínimo nacional, do aumento das pensões de reforma e de invalidez e do abono da família; o aumento dos salários e o congelamento dos salários superiores a 7 500 escudos; a generalização do direito a férias, com um subsídio equivalente ao salário; o congelamento dos preços e rendas dos prédios urbanos; os primeiros passos dados no sentido de assegurar, como direitos humanos fundamentais, o direito à Saúde e à Educação, que pelo seu conteúdo, marcaram de forma iniludível o sentido do processo em curso. E alguns indicadores e referências merecem ser sublinhados, por exemplo: a taxa de Analfabetismo era em 1974 de 34% é hoje inferior a 3 %,Lares sem luz eram 36% hoje andam pelos 0,2%,lares sem água de 53% passaram para menos de 1%,o SNS tornou-se uma realidade [hoje, fortemente atacado] ,triplicou o nº de Médicos por habitante, houve renovação e cobertura Hospitalar generalizada, a esperança de vida aumentou mais de 10 anos, a mortalidade infantil de 38 por mil passou para 3 por mil, os avanços na ciência ,inovação e investigação são prodigiosos tal como nas comunicações e acessos, a escola foi renovada, mais escola, melhor escola ,mais alunos inscritos e mais e melhores professores [ hoje, mais de 60.000 jovens licenciados ora desempregados e emigrando.]

Festejamos, aqueles 500 dias (do PREC) a que os detractores e inimigos da Revolução apelidaram de loucura …a loucura da Revolução de Abril.
«Loucura (como diz o revolucionário Coronel Varela Gomes) que foi epifania, que foi epopeia, que foi paixão e esperança, rasgar de horizontes, libertando mentes e medo; loucura que foi – e ficou sendo – interregno luminoso na apagada e vil tristeza da existência hodierna da Nação Portuguesa; que despertou o entusiasmo solidário e afectivo de multidões de homens e mulheres pelo mundo fora, saudando a coragem do desafio; loucura que fez tremer (de susto)  as elites lusitanas, em súplica permanente duma salvadora intervenção estrangeira, na postura agachada dos traidores e dos cobardes.»
«Ora, em contraste vindicativo com esses 500 dias de exaltação patriótica e alegria popular... Qual é o saldo dos 38 anos que se seguiram, com a governação exclusiva – virtual ditadura - dos partidos contra-revolucionários?»(Cit.JV.Gomes)

As Nacionalizações, a Reforma Agrária, a Descolonização - e a própria Constituição da República Portuguesa – afirmavam-se como pilar essencial da Revolução Portuguesa e do seu projecto de sociedade.
Apesar de aprovada e promulgada já depois da alteração da correlação de forças que levaria ao 25 de Novembro de 1975, a Constituição da República Portuguesa é um retrato fiel da revolução e, mesmo após as sete revisões a que foi submetida – todas elas roubando-lhe pedaços de Abril – permanece como referência essencial para os trabalhadores e o povo na sua luta contra a política de direita.
Tudo isso faz da defesa da Constituição um objectivo essencial da nossa luta, como alertou Vasco Gonçalves num texto produzido em 1977, numa altura em que as forças da contra-revolução disparavam raivosamente contra tudo o que cheirasse a Abril:
 «O essencial da Constituição Portuguesa está de acordo com as grandes transformações revolucionárias operadas no decurso do nosso processo revolucionário.
A essas transformações revolucionárias chamamos Conquistas da Revolução e uma delas é a própria Constituição (...) A defesa da Constituição Portuguesa é, portanto, a defesa das Conquistas da nossa Revolução»


Na sequência do gravoso ataque a essas mesmas conquistas da “Revolução dos Cravos” e à Constituição de Abril, um ataque com décadas de existência, após o 25 de Novembro do nosso descontentamento, e agravado nos últimos três anos com a invasão da “troika”, Portugal e os portugueses vivem hoje a pior situação política, económica, social e cultural após o 25 de Abril.
Os desencantos de hoje e respectivas frustrações nada têm a ver com o 25 de Abril. Não podemos branquear o fascismo.
Os desencantos de hoje e respectivas frustrações são fruto duma coligação de interesses e conjugação de factores internos e externos (*) a jusante da essência e natureza dum sistema predador responsável pela miséria, pela fome e pela doença de milhões de seres humanos. Chama-se: “capitalismo”, com as alcunhas de neoliberalismo, ultraliberalismo ou simplesmente “mercado”. O mesmo sistema que, com a mentira, a ganância e o virús mortal da austeridade, está hoje a destruir as Liberdades e as Democracias e perigosamente a lançar as bases do recrudescimento duma extrema – direita fascista/neo-nazi por diversos locais da Europa e do planeta.
Quem deixou, quem permitiu (como e quando?) que seja o “mercado” e seus tiranetes a mandar em nós?
Há anos que vimos afirmando que o sistema gera desumanas situações socioeconómicas, com uma aparente e ilusória contrapartida de progresso económico, onde os ricos têm ficado cada vez mais ricos e os pobres, cada vez, mais pobres.
A economia social foi estrangulada e a vertente financeira (especulação) sobrepõe-se à vertente produtiva (economia real).Esta é a essência da crise: A banca e a alta finança a comandar a política como antigamente, na ditadura derrubada. Só que agora com novos e sofisticados trunfos.
Foi assim, com este mando do “mercado”, a subserviência e trapaça destes governantes, nacionais e europeus, que se chegou a esta situação de crise nacional, europeia e internacional, pretendendo, os mandantes, curar as doenças com “remédios falsos” e insistindo na receita: a austeridade. Na mais completa e cega submissão aos números, no desprezo pela pessoa e pelas famílias, na mais grave recessão da economia, nas mais altas taxas de desemprego e pobreza, nos jovens empurrados para a emigração, na generalização da precariedade, na quebra dos salários e redução das pensões dos reformados, na despudorada e injusta carga fiscal, num feroz ataque ao direito ao trabalho, na grave contenção dos legítimos direitos na saúde, na segurança social, na educação e na justiça. Enfim, no firme ensejo de destruir por completo o Estado-Social construído à custa de décadas de lutas. No firme e planificado propósito de nos empobrecer.
Pobres e desempregados os portugueses ficam à mercê dos seus algozes.
Os três “DDD” do MFA foram vergonhosamente transformados em Desigualde, Desemprego, Desastre/Destruição.
Os diplomas dos governos revolucionários de Vasco Gonçalves defendiam e consolidavam os direitos básicos dos cidadãos. Hoje, ao invés, as leis que o mercado fabrica, as leis dos deslumbrados mandantes, subvertem e matam os direitos básicos dos trabalhadores e do povo.
Está na sua natureza, na natureza destes governantes e na sandice da sua demagogia oficial, sem vergonha, declarar: “a vida das pessoas está pior mas o país está melhor”. Que quer dizer isto? Até onde pode ir o desprezo pelas pessoas e o desconhecimento do país real?
E até onde vamos deixar ir esta afronta, esta violência?

Impõe-se derrubar este governo e suas políticas e recuperar a esperança que a madrugada libertadora nos trouxe retomando os seus valores fundamentais.
Queremos uma política que defenda o regime democrático, que edifique um Estado onde o trabalho, a solidariedade, a justiça, a educação e a cultura sejam pilares fundamentais, que coloquem o desenvolvimento da economia ao serviço das pessoas, das novas gerações e do futuro do País.
Assim como a descolonização, foi obra da luta de libertação dos povos, teremos de invocar novamente esse terceiro “D” para nos descolonizarmos da troika e do neoliberalismo com a bravura e luta dum povo soberano de há quase 900 anos.

No 40º aniversário desta data especial estamos certos que  estaremos – muitos, mas muitos mil - participando numa grande e calorosa festa de confraternização comemorativa e que será também forte protesto e a exigência da mudança necessária.

E também estamos contra a mistificação e hipocrisia de quem não merece comemorar Abril.E agora se faz de satisfeito! Hipócritas!
Que Abril poderão festejar quando todos os dias o pretendem matar e lhe dão facadas? O Abril deles não é o nosso.


Vamos ter eleições para o Parlamento Europeu a 25 de Maio. Urge reflectirmos sobre o significado destas eleições –as primeiras depois das troikas nos invadirem .Não queremos esta débil e falsa União Europeia (um gigante de pés de barro) para onde nos fizeram partir (em 1986) apenas com dez anos de democracia e com um estrondoso atraso estrutural económico, herdado da ditadura, (e ainda mais enfraquecido com o ataque à indústria,às pescas e à agricultura), o que só por si merecia, como muitos avisaram, outro tipo de negociações, outras cautelas, leviana e festivamente, desprezadas. É imprescindível que os deputados europeus saibam defender outra Europa. Urge votar nos que querem a mudança.Não ao voto em branco, não ao voto nulo. Urge votar contra o  inimigo.

Em 25 de Abril quisemos que as pessoas, os portugueses participassem no futuro.
Fizemos pontes para o futuro.
O poder hoje instalado “quer fazer do amanhã pontes para o passado”.
Quer regredir aos tempos de antes da revolução francesa.
Quer o empobrecimento de todos nós para que um por cento mande em noventa e nove por cento da humanidade. A austeridade é apenas um instrumento duma estratégia. Querem que se caia num “feudalismo moderno”.

Basta. Não deixaremos. Não ao conformismo. Não ao desânimo. O Povo Português não pode resignar-se e não se deixará vencer.

Estamos certos, o nosso 25 de Abril vencerá. Porque Abril é o Futuro.
25 de Abril, sempre!  

 Obrigado


M. Duran Clemente, Coronel ref.
Capitão de Abril, ex-autarca e associativista.    Abril de 2014