O Estado Social e o Neoliberalismo
……………………………………………………………………………………………………
A.LINCOLN, presidente americano, em 1865
afirmou: «só é possível acabar com a guerra civil se acabarmos com a
escravatura».
……………………………………………………………………………………………………
Por analogia, podemos dizer hoje que o ataque ao estado social só acaba quando
acabar o ataque à DEMOCRACIA, à LIBERDADE, às CONQUISTAS DE ABRIL, ao
esforço desenvolvido, com abnegação, pelos portugueses durante estes últimos 39
anos.
Só acaba quando acabar um poder com as
práticas de gestão nacional obedecendo ao padrão duma ideologia, antissocial e
insensível à realidade do país.
Só acaba quando formos capazes de
arredar da nossa vida o neoliberalismo. Neoliberalismo que teima em repor o
capitalismo no patamar em que ele se encontrava antes do Estado Social ser
erguido e ter atingido maturidade.
…………………………………………………………………………………………………………
Como sabemos este Estado Social
foi conseguido após longo período histórico de guerras destruidoras, de lutas
sociais ferozes e de crises económicas graves. Correspondeu a um compromisso
dentro do próprio Capitalismo, onde se digladiavam (e continuam a
confrontar-se) as suas duas correntes: a de John Keynes (capitalismo-Renano,
tendencialmente Social-Democrata) e a de Milton Friedman (capitalismo
Anglo-Saxónico, completamente Neoliberal).
Foi assim, face a uma necessidade do
Capitalismo, com a ajuda da sua corrente Keynesiana, reforçada com o imperativo
de fazer frente ao Socialismo e ao Comunismo, que foi erguido o compromisso do
Estado Social com cedências de ambos os lados: Capital e Trabalho.
O Estado Social, através dos impostos e
dos contributos dos cidadãos (de forma singular ou colectiva) veio desenvolver
um conjunto de políticas públicas e sociais favoráveis aos dois interesses contraditórios
e acaba por desempenhar um papel essencial na implementação das democracias
europeias, construindo e consolidando estabilidade e paz. Com ele
atingiram-se, na realidade, níveis de desenvolvimento significativos.
Mas o capitalismo não descansou. Após
atingir um grau de desenvolvimento apreciável, afastados com a queda da
"cortina de ferro" os, por si considerados, perigos do
socialismo real, o Capitalismo encontra novos apoios para alterar profundamente
a sua estratégia de acção. São pilares dessa sua investida, iniciada nos finais
do século passado e principio deste milénio, as novas tecnologias de
comunicação que lhe permitem a expansão e a globalização e a possibilidade de
aderir à prática da corrente, anglo saxónica, do capitalismo neoliberal de M.
Friedman. Via que contém em si todos os ingredientes para sufocar, estrangular
e aniquilar de vez o Estado Social.
Com a globalização o capital torna-se
movediço, sem pátria, foragido dos impostos e de qualquer outra obrigação
contributiva. Não se criaram ainda impostos ou contribuições supranacionais,
apesar dos esforços do movimento ATTAC/Taxa Tobin ao constituir proposta nesse
sentido. Por outro lado o Trabalho é dominado pela sua não fácil mobilidade,
pelo domínio de salários baixos e imposição de taxas. O Capital financeiro (por
vezes virtual, graças à “internet”) impôs-se ao Capital produtivo e tornou-se
mundialmente implacável criando, na realidade, mecanismos que visam a
escravização do labor.
Junte-se a isto, com a queda do muro de
Berlim, a entrada dos seus países num capitalismo selvagem e a “capitalização
do socialismo chinês” e verifica-se como o Trabalho enfrenta hoje, de novo,
enormes barreiras na luta por uma sociedade mais justa e humana.
A globalização do Estado Social nunca
poderia ocorrer tal como a do Capitalismo.
Não ocorrendo uma globalização da
Democracia e não havendo em muitas partes do planeta necessidade do referido
compromisso do Capitalismo, pelas razões que justificaram esse compromisso no
pós-guerra, tratou o Capitalismo de se encarregar, pela mão da sua corrente
neoliberal, da missão de destruir o Estado Social onde ele tinha sido criado e
agora se manifesta como um obstáculo à sua cega expansão.
As justificações são forjadas e contam
com a perversa auto destruição do próprio Estado, através dos mecanismos da
corrupção e de artifícios habilidosos.
Tudo se faz para conduzir à ideia de que
o Estado é ineficaz e que há que mudar para o Privado o que este sabe fazer
melhor (?) e mais barato (?),afirmações que a prática tem negado, e retirar ao
Estado e dar ao Mercado a regulação social.
Ataca-se tudo o que seja aparente bom
negócio não hesitando mesmo perante os resultados catastróficos para os
cidadãos e que estes tão vivamente contestam. O sector público, com base no
esvaziamento dos seus meios e na compra de funcionários corruptos, apostados em
afundar este sector e justificar as mudanças exigidas, é considerado estéril e
inoperante. Acentua-se aqui o fenómeno da corrupção, maleita natural do
capitalismo e mola real do afundamento das sociedades democráticas e do avanço
do neoliberalismo.
O que está em causa é a definição da
sociedade que se quer construir: uma sociedade onde os detentores do capital
explorem e dominem os trabalhadores, colocando-os em situações de autêntica
escravidão, como acontecera outrora.
O facto é que nos últimos tempos
se assiste ao maior dos retrocessos nas condições mais humanas para que as
sociedades caminharam e tentavam caminhar.
O neoliberalismo aqui na Europa parece não
estar interessado numa retoma.
Os objectivos perseguidos pelos
governos europeus e organizações envolvidas (BCE, Comissão Europeia, Banca e
grandes empresas) parecem não visar uma retoma rápida nem a redução das
assimetrias da zona Euro e da EU.
Será que para eles o essencial é evitar
um novo “crash” provavelmente superior ao de 2008? E para isso não hesitam em
aumentar a precaridade dos trabalhadores, o desemprego desenfreado, o
empobrecimento vertiginoso, a diminuição drástica dos salários e
das reformas?
Utilizam de forma exímia as disparidades
entre trabalhadores de diferentes países da EU, entre os do norte e centro e os
do sul, o que agrava ainda mais as disparidades já existentes dentro das
fronteiras nacionais? Parece que sim.
Torna-se imperioso desmontar as justificações
dos inimigos do Estado Social.A manipulação nos “media”, encostados à Banca e
às grandes empresas, é tenebrosa e visa captar apoios, ou no mínimo, a
passividade, dos cidadãos menos informados :
*Não há gorduras no Estado Social mas
sim necessidade de uma melhor gestão, afastando o compadrio e a corrupção. Como
se pode aceitar que haja por um lado despedimentos e por outro recrutamentos de
“boys” com salários de 4.000 a 5.000 euros. ??? Falta um estudo sério de
reestruturações sustentáveis e, sobretudo, de luta contra o amiguismo e a
descarada perversão.
*”Queremos mais do Estado do que estamos
a pagar” -como certas vozes afirmam. É uma falácia. A maioria dos portugueses
tem poucas posses e já contribui acima das suas possibilidades. Falta verificar
se os verdadeiramente ricos correspondem à solidariedade que lhes é
exigida e quem é que neste país é considerado “rico”. Se neste contexto europeu
, quem ganhe mensalmente 2000 a 3.000 euros ilíquidos, é considerado “rico”,
torna-se evidente a falta de seriedade da análise!
*Não será através de P.P.P.s (Parcerias
Público Privadas) que se obtêm melhores resultados, como a prática o tem
demonstrado na Saúde, na Educação, na Energia, nas Comunicações, nas
Estradas,etc. Conseguem-se sim maiores encargos para o Estado e para o cidadão
e os bolsos mais cheios para os corruptos intervenientes e para os novos donos
privados.
*A crise da divida, suscitando esta
ainda muitas incógnitas sobre os seus titulares e responsáveis, terá sido
essencialmente provocada pela corrupção, evasão fiscal e por uma gestão danosa
e com total ausência de políticas económicas, sociais, monetárias e fiscais
comuns da Europa. Criar nos portugueses um sentimento de culpa “de quem viveu
acima das suas possibilidades” é uma tentativa desonesta e insere-se numa
propaganda de falsas verdades, de obscurantismo e de desinformação .
*”Não há dinheiro” -diz quem governa.
Mas este só é procurado junto dos que não conseguem defender-se e dele (dinheiro)
até são pouco detentores.Com uma outra política de emprego, gerando emprego,
gerar-se-ia dinheiro. Depois tem de se taxar devidamente valores que até hoje
estão isentos ou são objecto de taxas mínimas :
-As mais-valias do desenvolvimento
tecnológico (que criam desemprego) não podem ser objecto de taxação só sobre o
Trabalho. As mais-valias resultantes da modernização terão de ser igualmente
taxadas. Não pode uma fábrica contribuir para a Segurança Social com cerca de
20%, da riqueza que cria, e uma empresa de energia e electricidade contribuir
apenas com 2%!
-A taxação de 0,25% sobre todas as
transacções financeiras daria uma contribuição anual de cerca de três mil
milhões de euros.(1)
-Para além de continuarem à margem da
fiscalidade os lucros das “especulações financeiras” deslocadas significativamente
dos recursos da produção, cerca de 70% das empresas estarão isentas de taxas de
mais-valias e continuam a maioria dos “jogos on-line” por ser taxados.Não
se fala disto!
………………………………………………………………………………………………………
A luta pela defesa do Estado Social
volta a estar cada vez mais na ordem do dia. Sabemos que em Portugal o Estado
Social só chegou com o 25 de Abrl e nunca atingiu o patamar da generalidade dos
países da Europa Ocidental.
Sabemos que a corrente neoliberal nunca
dará viabilidade ao Estado Social.
Sabemos que a Democracia não é viável
sem o Estado Social.
Democracia que há muito está sob o
ataque dos agentes do grande Capital. Veja-se como a Constituição é posta em
causa porque não permite que se realizem as medidas que (o Capital e os neoliberais)
consideram essenciais ao seu projecto político.
Urge, assim, quanto antes afastar os
neoliberais e as suas persistentes tentações de nos esmagarem. Não se poderá
desistir desta luta de sobrevivência em que se estará envolvido.
Veja-se o caso premente do ataque aos
reformados submetidos, pelo actual poder, a uma classe de cidadãos à parte. É
um exemplo. Só pode constatar-se como é atacada e marginalizada uma
significativa percentagem de portugueses que, com as suas pensões, tem sido
amparo de parentes desempregados e de pais de recursos escassos. Que tendo
vindo até aqui já a comparticipar nos custos da crise e é agora duplamente
espoliada de forma cruel e anti-democrática. Mas não podem os reformados
pensar que as suas justas reivindicações serão isoladas das reivindicações em
geral dos portugueses: de desempregados ou com emprego precário, de públicos ou
privados, de jovens ou com idade feita, enfim, de todos quantos a neoliberal
austeridade tem violentamente atingido.”
Confrontados com uma dura batalha de
sobrevivência estamos todos (os que sofrem) envolvidos e empenhados em acabar
com esta política neoliberal e afastar os seus fautores. Há várias
espécies de “guerras “para onde nos lançaram certos “experts” , conduzindo-nos
para uma inversão civilizacional
(como disse Gomes Canotilho) e regresso a outra forma de escravatura.
Só acabando com a escravatura seremos
livres e teremos paz. A.Lincoln sabia disso há 150 anos.
Só acabando com estas politicas
neoliberais acabará o ataque à esmagadora maioria dos cidadãos e
respectivas famílias. e, concomitantemente, cessará o mais violento
ataque, de que há memória, aos aposentados, pensionistas e reformados portugueses.
Manuel Duran Clemente Fev.2013
(Escrito de acordo com a antiga
ortografia)
…………………………………………………………………………………………………………………
(1)Alguns dados foram
obtidos do “Fórum Cidadania pelo Estado Social” promovido pela Associação 25 de
Abril,CES-Univ.de Coimbra, CICS/Univ.do Minho, IGOT-Univ.de Lisboa e
SOCIUS-Univ.Tecn.de Lisboa realizado na Fundação Gulbenkian em19 de
Novembro de 2012.
Excelente!!!
ResponderEliminar