sábado, 9 de agosto de 2014

A DESTRUIÇÃO DA CAPACIDADE PRODUTIVA DO PAÍS por Eugénio Rosa

A destruição da capacidade produtiva do país e os contribuintes ainda não estão a salvo no BES
Eugénio Rosa – economista – este e outros estudos disponíveis em www.eugeniorosa.com

A DESTRUIÇÃO DA CAPACIDADE PRODUTIVA DO PAÍS E DE VALOR NO BES

Um ponto importante, muitas vezes referido, que cria grandes preocupações até porque tem
efeitos nefastos a nível de criação de emprego e de aumento da produtividade e
competitividade, é a quebra acentuada que se tem verificado desde 2008 no investimento em
Portugal, situação esta que foi agravada pelo politica de austeridade recessiva imposta ao
país pela “troika” e agora também continuada pelo governo PSD/CDS. No entanto, um aspeto
que tem passado despercebido aos media e também à opinião pública é que o investimento
realizado nos últimos anos nem tem sido suficiente para compensar o desgaste sofrido pelo
“stock” de investimento, ou seja, para compensar o “consumo do capital fixo” como mostra o
quadro 1 construído com dados divulgados pelo INE.
Quadro 1 – Investimento realizado e consumo de capital fixo-1996/2013
ANO
INVESTIMENTO (Formação
Bruta de Capital Fixo)
Milhões €
DESGASTE ( Consumo de
capital fixo)
Milhões €
Consumo de capital fixo
em % da FBCF
1995 21.078,3 14.061,8 66,7%
1996 22.565,8 14.846,4 65,8%
1997 26.545,4 15.851,6 59,7%
1998 31.023,9 16.947,2 54,6%
1999 34.072,1 18.236,0 53,5%
2000 36.195,7 20.155,6 55,7%
2001 37.270,4 21.655,0 58,1%
2002 36.182,9 23.083,6 63,8%
2003 33.700,3 23.991,2 71,2%
2004 35.810,5 25.043,5 69,9%
2005 36.325,4 26.259,1 72,3%
2006 37.078,0 27.299,9 73,6%
2007 38.651,9 28.350,8 73,3%
2008 39.817,3 29.745,6 74,7%
2009 34.050,9 29.795,2 87,5%
2010 34.874,8 30.444,1 87,3%
2011 31.542,0 31.082,6 98,5%
2012 27.492,6 31.322,7 113,9%
2013 25.563,9 31.100,2 121,7%
FONTE : Contas Nacionais Anuais Preliminares - 1995-2013 - INE
Como revelam os dados do INE, a partir de 2008 verificou-se no nosso país uma quebra
acentuada do investimento pois, entre 2008 e 2013, ele passou de 39.817,3 milhões € para
25.563,9 milhões € (- 35,8%). E isto a preços correntes.
Mas uma aspeto que tem sido esquecido ou mesmo escondido é que, com a politica de
austeridade recessiva imposta pela “troika” e pelo governo PSD/CDS, e agora continuada por
este, tem-se verificado que o desgaste no “stock” de investimento existente (consumo de
capital fixo) foi, já em 2012, superior em 13,9% ao investimento (FBCF) realizado neste ano
e, em 2013, em 21,7%, Portanto, a capacidade produtiva do país não só não está a ser
renovada, modernizada e ampliada, mas também está a sofrer uma forte degradação pois o
valor desgastado resultante da sua utilização (consumo de capital fixo) , não está a ser pelo
menos reposto: - em 2012, consumiu-se mais 3.830,1 milhões € do que se investiu e, em
2013, o consumo de capital fixo foi superior ao investimento (FBCF) em 5.536,3 milhões €. É
evidente que o país não aguenta por muito mais tempo este nível de destruição da sua
capacidade produtiva sem pôr em perigo uma recuperação sustentada e o seu
desenvolvimento futuro.
A destruição da capacidade produtiva do país e os contribuintes ainda não estão a salvo no BES
Eugénio Rosa – economista – este e outros estudos disponíveis em www.eugeniorosa.com

ENQUANTO O INVESTIMENTO CAI, ASSISTE-SE À DESTRUIÇÃO MACIÇA DE VALOR (RIQUEZA) NO BES, NÃO ESTANDO OS CONTRIBUINTES A SALVO DE PAGAREM A FATURA

Enquanto o investimento cai de uma forma dramática no país (o investimento público diminuiu,
entre 2010 e 2013, 63,2%), pondo em perigo não só o presente mas também o futuro de
Portugal, assiste-se à destruição maciça de valor, ou seja, de riqueza, no BES (milhares de
milhões € desapareceram). E para o governo e BdP é como nada tivessem a ver com isso.
Efetivamente, quem tenha ouvido na audição na Assembleia da República, no dia 7.8.2014,
quer a ministra das Finanças quer o governador do Banco de Portugal, certamente não pode
ter ficado tranquilo com a fuga às responsabilidades por parte de ambos. A única explicação
que conseguiram dar para o facto de 15 dias antes ambos afirmarem, a pés juntos, que o
BES era um banco sólido e que possuía uma almofada financeira suficiente para suportar os
prejuízos decorrentes da exposição ao grupo, e 15 dias depois dizerem precisamente o
contrário é que tinham sido enganados, e que só tiveram conhecimento de informação
“materialmente relevante” muito recentemente. E, à semelhança do afirmado por Vitor
Constância aquando do caso do BPN, Carlos Costa disse e repetiu que é praticamente
impossível detetar esquemas fraudulentos como o do BES a não ser em caso de denúncia
interna (quando as comadres se zangam) ou então em situação de grave crise financeira
Mas não é só por esta razão, que que os portugueses não podem ficar tranquilos. Muitas
outras afirmações não podem deixar de provocar, pelo menos, grandes perplexidades
Segundo a ministra, o Estado não tem qualquer responsabilidade no “novo banco” porque
não é acionista, por isso não manda no banco. No entanto, embora não mande no “novo
banco” prontificou-se a entrar com um empréstimo de 3.900 milhões €. A ministra achou que
era legitimo a “troika” impor o que quis ao país porque concedeu um empréstimo (era o
credor), mas já não acha legitimo que o Estado mande no “novo banco” apesar de por lá
dinheiro dos contribuintes. A ministra também garantiu que os contribuintes iriam ser
reembolsados do empréstimo, embora antes tenha afirmado, a pés juntos, que não haveria
dinheiro dos contribuintes no BES. E para justificar essa garantia disse que se o “novo banco”
fosse vendido a um preço inferior as instituições financeiras (os bancos) pagariam o
empréstimo com as quotizações para o Fundo de resolução. Segundo o artº 10º do DL
24/2013 as contribuições da banca para este fundo são calculadas com base no passivo da
banca deduzido dos depósitos cobertos pelo Fundo de garantia de depósitos e dos fundos
próprios complementares. E a taxa máxima a aplicar é 0,07% de acordo com o Aviso 1/2013
do Banco de Portugal. No caso de aplicação da taxa máxima isso daria uma receita que não
seria superior a 219 milhões€/ano. Portanto, para reembolsar os 3.900 milhões € que o
Estado vai emprestar ao “novo banco” seriam necessários 18 anos, sem incluir juros, ou seja,
um período superior ao concedido pela “troika”, sendo 56 milhões €/ano pagos pela CGD, ou
seja, pelo banco público, que é o maior contribuinte. E quem paga até lá tudo isto? Os
contribuintes. E tem a desfaçatez de dizer que não será utilizado dinheiro dos contribuintes.
Mas ainda se fica mais intranquilo quando se analisa algumas das afirmações do governador
do Banco de Portugal na audição que passaram despercebida aos deputados. Para além de
se limitar a repetir muitas vezes o que tinha dito anteriormente (até leu comunicados e
intervenções passadas) para se desculpar, ele afirmou, mais de uma vez, que o BdP tinha
mandado fazer uma auditoria aprofundado aos ativos e passivos do “novo banco” para avaliar
o valor real dos ativos que foram transferidos para o “novo banco”. Isto significa na prática
que foram transferidos para o “novo banco”, sob a responsabilidade do Banco de Portugal,
ativos de muitos milhares de milhões € (segundo as contas do 1º semestre de 2014, o valor do
Ativo do BES atingia 80.216 milhões €), cujo verdadeiro valor o próprio Banco de Portugal
desconhece. E poderão surgir ainda surpresas muito desagradáveis com fatura para os
contribuintes, pois naturalmente a banca vai-se recusar pagar dizendo que tudo foi feito por
decisão do Banco de Portugal. No mesmo dia da audição, Vitor Bento deu uma entrevista à
SIC, onde afirmou que estava a elaborar um plano de reestruturação do “novo banco” que
podia passar por fecho de balções e redução do número de trabalhadores, precisamente o
contrário do garantido pela ministra e pelo governador do BdP de que a “solução” não
acarretaria despedimentos. De novo o “fantasma” do BPN surge, com a toda incerteza e
insegurança criada pelas palavras da ministra e do governador do BdP. Até porque no fim da
audição ficou por esclarecer se o Estado (os contribuintes), poderá ou não ser objeto de
inúmeros processos judiciais com pedidos de indemnização e o que acontecerá às 173
empresas associadas e subsidiárias com 3.590 trabalhadores que consolidavam nas contas
do BES (págs.106/109 do RC-2013) Eugénio Rosa , ed2@netacbo.pt , 8.8.2014

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