terça-feira, 26 de novembro de 2013

25 d’avril  à Fontenay-sous-Bois et défilée de la liberté

Monsieur le Maire, Monsieur Jean-François Voguet
Madames e Messieurs les Adjoints au Maire, (
Mesdames et Messieurs les élus,

Mes chers concitoyens… mes chers amis.

Je tiens tout d’abord à remercier les organisateurs de l’aimable invitation à prendre part à cet événement  et de l’accueil qui m’a été réservé.
Merci pour ce beau monument dédié au 25 Avril
Merci à tous ceux qui ont contribué à l'existence de ce monument, unique en France, et plus particulièrement à M. Baptista de Matos.

Au 25 avril 1974  plus que la force des armes, les militaires  avaient la force de la raison des peuples du Portugal e des Colonies et avaient la vertu de la souffrance et de l'oppression accumulées pendant quarante-huit ans de dictature
Avec cette force on a fait le coup d’état et renversé un “Etat Vieux” et obsolète.
Le people - le véritable héros de la peste fasciste - n’a pas resté chez soi – immédiatement il a occupé les sièges qui lui appartenaient depuis longtemps: - dans les municipalités, dans les usines, dans les quartiers, dans les écoles ...... partout … est devenu :
La Révolution ... La Révolution des Œillets… La Révolution d’Avril.
C'était la fin de la dictature et la voie était ouverte à l’indépendance des peuples colonisés, à la participation des citoyens dans la vie publique, au développement économique, social et culturel.
Trente neuf ans plus tard et à la suite de pratiquer une politique contraire à l'esprit d’avril, on a vérifié que beaucoup des projets d’alors sont tombés par terre et beaucoup d’espoirs ont été ratés.
Le Portugal vit aujourd’hui le pire des moments politique, économique et social depuis le 25 avril,
Le néo-libéralisme et les prêteurs d'argent et un gouvernement national faible, avec de fausses mesures, sont les responsables de la plus forte attaque sur l'Etat-Social et les droits du travail décent.
Avec cette politique, le Portugal monte une récession économique croissante et le taux de chômage le plus élevé; le pays est de plus en plus pauvre et inégalitaire.
Nous avons besoin de retrouver l'espoir que l'aube du 25 Avril nous a apporté et de revoir ses valeurs essentielles. Il est urgent et indispensable une politique différente. Il faut que le développement soit mis au service de ceux qui travaillent et de ceux qui ont travaillé, de la jeunesse et de l’avenir du Pays.
Le 25 avril, qu’on évoque, ne peut pas rater les expectatives créées. Celui-ci, aura besoin de donner réponse aux énormes problèmes, avec lesquels les nouvelles générations se débattent et qui forcent surtout les plus jeunes à l’émigration. Deux cent mille jeunes sont sortis de Portugal dans les deux dernières années.
Chers amis,
- À côté de toutes les manifestations de joie pour célébrer la datte de la liberté – le 25 avril – celui que fût un des moments le plus lumineux de l’Histoire du Portugal;
-À côté de toutes les commémorations à fêter cette datte, soit au Portugal soit dans les quatre coins du monde, avec les émigrants et leurs familles, (qui sont aussi des héros dans le passé et le sont dans le présent);
-À côté de cette forte et unie fraternité devra également être une manifestation: - de résistance à défendre les valeurs de Avril et de protestation et d’exigence du changement nécessaire, au Portugal et en Europe, faite par chacun de nous et par tous les patriotes qui ne baissent pas les bras et ne jamais cessent le combat.
Le “défilée de la liberté” que nous venons de faire, ce soir, c’est bien le symbole de la façon de marcher et comment faire les chemins. Même dans les pires et sombres sentiers ils peuvent être éclairés par des flambeaux, cette «lumière» est la force qui est donnée par le sentiment d'un peuple qui ne se résigne pas et jamais se laissera tomber.
Le 25 Avril construit ponts pour l’avenir aujourd’hui quelqu’un vut jeter ponts vers le passé.
On est sure : “on va vaincre la peur et on va poursuivre l’avril.”.
Merci à tous
« VIVA O 25 de ABRIL »       Vive le 25 Avril
Vive l’amitié ente le peuple Portuguais e le peuple Français.
«VIVA Portugal»
                                                              25 Avril toujours!

M. Duran Clemente /Cap. d’Avril       à Fontenay s/s Bois     26.Avril.2013


A GUERRA COLONIAL..na primeira pessoa!!!!

21 de Julho de 2013 às 22:51
A GUERRA COLONIAL
Hoje

(excerto duma conversa no FB)

19:23
Carlos Da Cruz Ramalho
Olá Duran Clemente! Envio-lhe um abraço do Bravo Ferreira, com quem estive 15 dias em S.Pedro de Muel nas termas, a ver se me safo dos meus achaques! Ele pediu-me que lhe enviasse um abraço e aqui estou a cumprir a promessa! Soube também por ele, uma coisa que me emocionou muito: a morte de um rapaz de Muge, que morreu em vésperas de vir para a metrópole, e a quem o Sr. deu um beijo, dizendo: "Este beijo, é o da tua mãe!" O rapaz, que ele sempre protegeu, era filho de uma família minha amiga de Muge e que não escrevia desde há muito à mãe, e que ele a meu pedido, fez o favor de encontrar! O seu gesto, contado pelo meu primo, reflecte o seu carácter, e a fibra dos grandes homens! Bem haja e um abraço de amizade e reconhecimento também, do Carlos Ramalho

21:17
Manuel Duran Clemente
Obrigado Amigo, esse rapaz, era um diligente militar, Cabo no Batalhão de Intendência da Guiné,onde fui segundo comandante ,sendo comandante o então Major Bravo Ferreira,homem bom. Esse jovem militar foi numa missão ao porto fluvial de Cufar (Destacamento de Intendência do BIG,na zona) num barco que para ali levou mantimentos, para abastecimento das guarnições da região. Nos vários transportes de mantimentos na viatura, entre o barco e os armazéns durante o dia, nada aconteceu. Num dos últimos trajectos a viatura passou por cima duma mina , certamente colocada entretanto, ma s a potência da mesma era tal que cavou um buraco do tamanho da viatura e matou de imediato quatro dos cinco militares. Pela sua constituição, o quinto, o nosso amigo ficou muito ferido e foi transportado de helicóptero para o Hospital de Bissau, onde esteve 52 dias em coma!!!Recebi as ultimas cartas dos pais e da mãe que lhas li no hospital. Em que assustados não percebiam a razão de não receberem correio nos últimos 50 dias.Fui preparando os pais para o que se adivinhava ser um fim infeliz ,mas ainda com alguma esperança.
O pior aconteceu.
O meu gesto foi um gesto de pai e de mãe.
PARA HAVER 25 DE ABRIL MUITOS MORRERAM.MAS FORAM AS SEMENTES DA REVOLTA E DA LIBERDADE!!!
OBRIGADO.
HOMENAGEM A TODOS OS QUE MORRERAM OU FICARAM DIMINUIDOS POR UMA ESTÚPIDA
 GUERRA COLONIAL
Manuel Duran Clemente

segunda-feira, 25 de novembro de 2013

O Estado Social e o Neoliberalismo

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A.LINCOLN, presidente americano, em 1865 afirmou: «só é possível acabar com a guerra civil se acabarmos com a escravatura».
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Por analogia, podemos dizer hoje  que o ataque ao estado social só acaba quando acabar o ataque à DEMOCRACIA, à LIBERDADE, às CONQUISTAS DE  ABRIL, ao esforço desenvolvido, com abnegação, pelos portugueses durante estes últimos 39 anos.

Só acaba quando acabar um poder com as práticas de gestão nacional obedecendo ao padrão duma ideologia, antissocial e insensível à realidade do país.

Só acaba quando formos capazes de arredar da nossa vida o neoliberalismo. Neoliberalismo que teima em repor o capitalismo no patamar em que ele se encontrava antes do Estado Social ser erguido e ter atingido maturidade.
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 Como sabemos este Estado Social foi conseguido após longo período histórico de guerras destruidoras, de lutas sociais ferozes e de crises económicas graves. Correspondeu a um compromisso dentro do próprio Capitalismo, onde se digladiavam (e continuam a confrontar-se) as suas duas correntes: a de John Keynes (capitalismo-Renano, tendencialmente Social-Democrata) e a de Milton Friedman (capitalismo Anglo-Saxónico, completamente Neoliberal).
Foi assim, face a uma necessidade do Capitalismo, com a ajuda da sua corrente Keynesiana, reforçada com o imperativo de fazer frente ao Socialismo e ao Comunismo, que foi erguido o compromisso do Estado Social com cedências de ambos os lados: Capital e Trabalho.
O Estado Social, através dos impostos e dos contributos dos cidadãos (de forma singular ou colectiva) veio desenvolver um conjunto de políticas públicas e sociais favoráveis aos dois interesses contraditórios e acaba por desempenhar um papel essencial na implementação das democracias europeias, construindo e consolidando  estabilidade e paz. Com ele atingiram-se, na realidade, níveis de desenvolvimento significativos.
Mas o capitalismo não descansou. Após atingir um grau de desenvolvimento apreciável, afastados com a queda da "cortina de ferro" os, por si considerados, perigos do socialismo real, o Capitalismo encontra novos apoios para alterar profundamente a sua estratégia de acção. São pilares dessa sua investida, iniciada nos finais do século passado e principio deste milénio, as novas tecnologias de comunicação que lhe permitem a expansão e a globalização e a possibilidade de aderir à prática da corrente, anglo saxónica, do capitalismo neoliberal de M. Friedman. Via que contém em si todos os ingredientes para sufocar, estrangular e aniquilar de vez o Estado Social.
Com a globalização o capital torna-se movediço, sem pátria, foragido dos impostos e de qualquer outra obrigação contributiva. Não se criaram ainda impostos ou contribuições supranacionais, apesar dos esforços do movimento ATTAC/Taxa Tobin ao constituir proposta nesse sentido. Por outro lado o Trabalho é dominado pela sua não fácil mobilidade, pelo domínio de salários baixos e imposição de taxas. O Capital financeiro (por vezes virtual, graças à “internet”) impôs-se ao Capital produtivo e tornou-se mundialmente implacável criando, na realidade, mecanismos que visam a escravização do labor.
Junte-se a isto, com a queda do muro de Berlim, a entrada dos seus países num capitalismo selvagem e a “capitalização do socialismo chinês” e verifica-se como o Trabalho enfrenta hoje, de novo, enormes barreiras na luta por uma sociedade mais justa e humana.
A globalização do Estado Social nunca poderia ocorrer tal como a do Capitalismo.
Não ocorrendo uma globalização da Democracia e não havendo em muitas partes do planeta necessidade do referido compromisso do Capitalismo, pelas razões que justificaram esse compromisso no pós-guerra, tratou o Capitalismo de se encarregar, pela mão da sua corrente neoliberal, da missão de destruir o Estado Social onde ele tinha sido criado e agora se manifesta como um obstáculo à sua cega expansão.
As justificações são forjadas e contam com a perversa auto destruição do próprio Estado, através dos mecanismos da corrupção e de artifícios habilidosos.
Tudo se faz para conduzir à ideia de que o Estado é ineficaz e que há que mudar para o Privado o que este sabe fazer melhor (?) e mais barato (?),afirmações que a prática tem negado, e retirar ao Estado e dar ao Mercado a regulação social.
Ataca-se tudo o que seja aparente bom negócio não hesitando mesmo perante os resultados catastróficos para os cidadãos e que estes tão vivamente contestam. O sector público, com base no esvaziamento dos seus meios e na compra de funcionários corruptos, apostados em afundar este sector e justificar as mudanças exigidas, é considerado estéril e inoperante. Acentua-se aqui o fenómeno da corrupção, maleita natural do capitalismo e mola real do afundamento das sociedades democráticas e do avanço do neoliberalismo.
O que está em causa é a definição da sociedade que se quer construir: uma sociedade onde os detentores do capital explorem e dominem os trabalhadores, colocando-os em situações de autêntica escravidão, como acontecera outrora.

O facto é que nos últimos tempos  se assiste ao maior dos retrocessos nas condições mais humanas para que as sociedades caminharam e tentavam caminhar.

O neoliberalismo aqui na Europa parece não estar interessado numa retoma.
Os objectivos  perseguidos pelos governos europeus e organizações envolvidas (BCE, Comissão Europeia, Banca e grandes empresas) parecem não visar uma retoma rápida nem a redução das assimetrias da zona Euro e da EU.

Será que para eles o essencial é evitar um novo “crash” provavelmente superior ao de 2008? E para isso não hesitam em aumentar a precaridade dos trabalhadores, o  desemprego desenfreado, o empobrecimento vertiginoso, a diminuição drástica dos salários e das reformas?
Utilizam de forma exímia as disparidades entre trabalhadores de diferentes países da EU, entre os do norte e centro e os do sul, o que agrava ainda mais as disparidades já existentes dentro das fronteiras nacionais? Parece que sim.

Torna-se imperioso desmontar as justificações dos inimigos do Estado Social.A manipulação nos “media”, encostados à Banca e às grandes empresas, é tenebrosa e visa captar apoios, ou no mínimo,  a passividade, dos cidadãos menos informados :

*Não há gorduras no Estado Social mas sim necessidade de uma melhor gestão, afastando o compadrio e a corrupção. Como se pode aceitar que haja por um lado despedimentos e por outro recrutamentos de “boys” com salários de 4.000 a 5.000 euros. ??? Falta um estudo sério de reestruturações sustentáveis e, sobretudo, de luta contra o amiguismo e a descarada perversão.

*”Queremos mais do Estado do que estamos a pagar” -como certas vozes afirmam. É uma falácia. A maioria dos portugueses tem poucas posses e já contribui acima das suas possibilidades. Falta verificar  se os verdadeiramente ricos correspondem à solidariedade que lhes é exigida e quem é que neste país é considerado “rico”. Se neste contexto europeu , quem ganhe mensalmente 2000 a 3.000 euros ilíquidos, é considerado “rico”, torna-se evidente a falta de seriedade da análise!

*Não será através de P.P.P.s (Parcerias Público Privadas) que se obtêm melhores resultados, como a prática o tem demonstrado na Saúde, na Educação, na Energia, nas Comunicações, nas Estradas,etc. Conseguem-se sim maiores encargos para o Estado e para o cidadão e os bolsos mais cheios para os corruptos intervenientes e para os novos donos privados.

*A crise da divida, suscitando esta ainda muitas incógnitas sobre os seus titulares e responsáveis, terá sido essencialmente provocada pela corrupção, evasão fiscal e por uma gestão danosa e com total ausência de políticas económicas, sociais, monetárias e fiscais comuns da Europa. Criar nos portugueses um sentimento de culpa “de quem viveu acima das suas possibilidades” é uma tentativa desonesta e insere-se numa propaganda de falsas verdades, de obscurantismo e de desinformação .

*”Não há dinheiro” -diz quem governa. Mas este só é procurado junto dos que não conseguem defender-se e dele (dinheiro) até são pouco detentores.Com uma outra política de emprego, gerando emprego, gerar-se-ia dinheiro. Depois tem de se taxar devidamente valores que até hoje estão isentos ou são objecto de taxas mínimas :
-As mais-valias do desenvolvimento tecnológico (que criam desemprego) não podem ser objecto de taxação só sobre o Trabalho. As mais-valias resultantes da modernização terão de ser igualmente taxadas. Não pode uma fábrica contribuir para a Segurança Social com cerca de 20%, da riqueza que cria, e uma empresa de energia e electricidade contribuir apenas com 2%!
-A taxação de 0,25% sobre todas as transacções financeiras daria uma contribuição anual de cerca de três mil milhões de euros.(1)
-Para além de continuarem à margem da fiscalidade os lucros das “especulações financeiras” deslocadas significativamente dos recursos da produção, cerca de 70% das empresas estarão isentas de taxas de mais-valias e  continuam a maioria dos “jogos on-line” por ser taxados.Não se fala disto!
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A luta pela defesa do Estado Social volta a estar cada vez mais na ordem do dia. Sabemos que em Portugal o Estado Social só chegou com o 25 de Abrl e nunca atingiu o patamar da generalidade dos países da Europa Ocidental.
Sabemos que a corrente neoliberal nunca dará viabilidade ao Estado Social.
Sabemos que a Democracia não é viável sem o Estado Social.
Democracia que há muito está sob o ataque dos agentes do grande Capital. Veja-se como a Constituição é posta em causa porque não permite que se realizem as medidas que (o Capital e os neoliberais) consideram essenciais ao seu projecto político.

Urge, assim, quanto antes afastar os neoliberais e as suas persistentes tentações de nos esmagarem. Não se poderá desistir desta luta de sobrevivência em que se estará envolvido.

Veja-se o caso premente do ataque aos reformados submetidos, pelo actual poder, a uma classe de cidadãos à parte. É um exemplo. Só pode constatar-se como é atacada e marginalizada uma significativa percentagem de portugueses que, com as suas pensões, tem sido amparo de parentes desempregados e de pais de recursos escassos. Que tendo vindo até aqui já a comparticipar nos custos da crise e é agora duplamente espoliada  de forma cruel e anti-democrática. Mas não podem os reformados pensar que as suas justas reivindicações serão isoladas das reivindicações em geral dos portugueses: de desempregados ou com emprego precário, de públicos ou privados, de jovens ou com idade feita, enfim, de todos quantos a neoliberal austeridade tem violentamente atingido.”
Confrontados com uma dura batalha de sobrevivência estamos todos (os que sofrem) envolvidos e empenhados em acabar com esta política neoliberal e afastar os seus fautores. Há várias espécies de “guerras “para onde nos lançaram certos “experts” , conduzindo-nos para uma inversão civilizacional (como disse Gomes Canotilho) e regresso a outra forma de escravatura.
Só acabando com a escravatura seremos livres e teremos paz. A.Lincoln sabia disso há 150 anos.

Só acabando com estas politicas neoliberais acabará o ataque à esmagadora maioria dos cidadãos e respectivas  famílias. e, concomitantemente, cessará o mais violento ataque, de que há memória, aos aposentados, pensionistas e reformados  portugueses.

Manuel Duran Clemente                   Fev.2013
(Escrito de acordo com a antiga ortografia)
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            (1)Alguns dados foram obtidos do “Fórum Cidadania pelo Estado Social” promovido pela Associação 25 de Abril,CES-Univ.de Coimbra, CICS/Univ.do Minho, IGOT-Univ.de Lisboa e SOCIUS-Univ.Tecn.de Lisboa  realizado na Fundação Gulbenkian em19 de Novembro de 2012.



O que nos unirá?

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A “temperatura” nos une!? Unirá?

Talvez, sobretudo quando (...ou só quando) faz muito frio.
No tempo quente mergulhamos e encontramos as conchas e os corais e com eles nos enlevam os sonhos, se acatam as agruras e se desfazem lamúrias...e o tubarão nos engole...

Mesmo submergindo...o ar é outro e já não é o que nos serve para respirar/viver/ ou sobreviver...

Na onda se vão os remos... porque o barquinho piroga se afundou...sem o nosso peso que o equilibrava...

Os remos se afastam...e vão abraçar outros navegantes de quimeras....


MDC  8.06.2011
SE ESPERAS...NÃO DESESPERES!

"Quem espera desespera.../o melhor é esperar pelo que está dentro de nós/e encontrarmos mais depressa uma voz/e olhando o céu à noitinha/se vejam estrelas que caminham/se ouça um vento não barulhento/e na ramagem das silvas amoras/se colha nelas companhia e alento/ ...e sem medo de errar...se possa ser destemido ou destemida /se flua no precipício e se voe para o mar/...

…e de si, pessoa, seja sobretudo amiga/para poder trespassar ondas e amar....”


MDC 04 07 2011

URBANO Tavares Rodrigues…Até já, amigo!





( «Nunca aceitaria qualquer tirania…») [Urbano Tavares Rodrigues]


(«Uso a palavra amor no sentido mais lato, não só sexual. A grande lição para o mundo futuro é uma grande dose de amor, de compreensão dos outros. Não sei se nota isso nos meus livros.») [Urbano Tavares Rodrigues]


(«A poesia de alta qualidade, mesmo quando não parece directamente ligada ao processo revolucionário, é sempre progressista. Porque a beleza em si é uma forma de progresso, de aperfeiçoamento do ser humano»  [Urbano Tavares Rodrigues]



I-A tua escrita foi feita coma tinta da luta e do amor. 

Mais um Amigo que nos deixa neste mês de Agosto de 2013.Urbano Tavares Rodrigues.
Conheci-te há mais de quarenta anos (Abril de 1973) no III Congresso da Oposição Democrática em Aveiro, quando eras membro da sua Comissão Nacional. Apresentaram-me como um capitão revoltado e trocámos documentos. Foste dos que conheceste o meu manifesto/requerimento contra a situação e o teu sorriso luminoso e esperançoso ouviu palavras minhas premonitórias sobre o fim do regime por parte dos militares. Já tínhamos começado a mexer.

Sempre que nos encontrávamos falavas-me de ABRIL…e os teus olhos brilhavam. No teu olhar estava tudo o que o nosso Abril merece: encantamento, fraternidade, amizade, solidariedade, liberdade, saudade…e tudo o mais que sente a cabeça e o coração!
Os anos foram passando. Fomo-nos encontrando esporadicamente. Quanto mais debilitado te víamos mais luminoso e penetrante era o teu sorriso. A tua partida não foi inesperada. Foi desgosto grande. Os quase noventa anos não perdoam; nem aos génios perdoam!

Dizem teres sido um escritor e sedutor indignado. Sim. Mas foste sobretudo um combatente serenamente apaixonado. A tua escrita foi feita coma tinta da luta e do amor. Foste um nobre guerreiro, militante de espada, por um melhor mundo, cuja lâmina tinha a dimensão plana do teu Alentejo e bem representava também a cruz das gentes sofridas, na elevação da sua dignidade, tão profusamente por ti defendida!

II- Nunca aceitarias qualquer tirania .

No poema “Destino” do teu livro “Horas de Vidro” dizes bem quem és:

«Trago na fonte/e estrela do fogo/da minha revolta/Nunca aceitaria qualquer tirania/nem a do dinheiro/nem a do mais justo ditador/nem a própria vida eu aceito.../tal como ela é/com todas as promessas/do amor e da juventude/e a parda doença/de envelhecer/a morte em cada dia/antecipada. Na mais lebrega alfurja/ou na cama de folhas macias/da floresta/da onde a chuva te adormeceu/há sempre um idamente de sol/cujos raios te penetram de/ventura/ao sonhares a palavra/liberdade.»

III- Biografia resumida.

“Filho do escritor Urbano Rodrigues, nasceu em Lisboa e passou a infância em Moura. Criado numa família de grandes proprietários agrícolas, recebeu as influências das gentes do campo, o que marcou indelevelmente. Frequentou a Faculdade de Letras de Lisboa, onde se licenciou em Filologia Românica. Impedido de leccionar em Portugal, foi leitor de português nas universidades de Montpellier, Aix e Paris, entre os anos de 1949 e 1955. Depois do 25 de Abril de 1974 regressou a Portugal. Em 1984 doutorou-se em Literatura, com uma tese sobre a obra de Manuel Teixeira Gomes. Em 1993 jubila-se como professor catedrático da Faculdade de Letras. Foi igualmente professor na Universidade Autónoma de Lisboa Luís de Camões. Foi membro efectivo da Academia de Ciências de Lisboa e membro correspondente da Academia Brasileira de Letras.”(Wilkipédia)

 “Escreveu em diversas revistas e jornais, como o Bulletin  des  Études  Portugaises, a Colóquio-Letras, o Jornal de Letras, Vértice,  Nouvel Observateur, entre outros. Foi director da revista Europa e crítico de teatro d' O Século e do Diário de Lisboa. Enquanto repórter percorreu grande parte do mundo, tendo reunido os seus relatos de viagem nos volumes Santiago de Compostela (1949), Jornadas no Oriente  (1956) e Jornadas na Europa (1958)(….) (…) Recebeu variados galardões literários, como o Prémio Ricardo Malheiros, da Academia das Ciências de Lisboa, com a obra Uma Pedrada no Charco — é de salientar que o seu pai, Urbano Rodrigues, já tinha vencido este prémio na edição do ano de 1948, com a obra O Castigo de D. João —, o Prémio da Associação Internacional de Críticos Literários, o Prémio da Imprensa Cultural, o Prémio Vida Literária da Associação Portuguesa de Escritores e o Grande Prémio de Conto Camilo Castelo Branco.””(Wilkipédia)

IV- O amor, para ti, como uma necessidade absoluta do mundo.

Numa entrevista ao jornal Público/Ípsilon, o ano passado, voltámos a ouvir a tua inteligência falar de amor:

«Não consigo escrever qualquer coisa que seja completamente nova, mas consigo escrever de uma maneira nova e cada vez mais olho o amor como uma necessidade absoluta do mundo»(…)«Uso a palavra amor no sentido mais lato, não só sexual. A grande lição para o mundo futuro é uma grande dose de amor, de compreensão dos outros. (…).»
Foste um dos autores portugueses mais prolíficos da segundam metade do séc. XX. Como já assinalámos recebeste vários galardões literários, Mas ao Ípsilon, na mesma entrevista, confessavas-te desiludido e revoltado por nunca ter recebido o Prémio Camões, e porquê?
«Ainda não tive o prémio Camões porque soube recentemente que há membros do júri que dizem: “esse comunista não terá o Prémio Camões"».
E bem o merecias, todos sabemos. Nunca deixaste de ser corajoso e frontal, senhor das tuas convicções e daí a tua mais que justa revolta perante o sistema cego e preconceituoso!

V- Entre o realismo e o fantástico e a pressão da realidade envolvente.

Casado com a também brilhante escritora Maria Judite de Carvalho, que morreu em 1998, e pai de Isabel Fraga, romancista e tradutora, deixas ainda um filho com sete anos “o teu menino António” fruto de um segundo matrimónio a rondar os oitenta anos.
Autor de uma vasta obra escrita, no romance, novela, conto, teatro, poesia, crónica, viagens, ensaio e jornalismo. Nela estão presentes os valores humanos que sempre acarinhaste: -liberdade, solidariedade e justiça social. 

Afirmaste, em tempos, que a tua obra foi influenciada pelo existencialismo francês da década de 1950, ocasião em que integras uma geração neorrealista preocupada em analisar o marxismo sob a óptica dos acontecimentos históricos fracturante na época. Mais tarde, na sequência da tua detenção no forte de Caxias, durante a ditadura surges como autor de resistência, a que se seguiu um novo período de esperança no pós-25 de Abril. Mas numa entrevista feita a José Manuel Mendes, em 1989,tu próprio te defines como dividido «entre o realismo e o fantástico», esclarecendo contudo que nunca tiveras uma escola mas sim «a pressão da realidade envolvente». Deixaste uma obra literária e ensaística muito vasta e traduzida em inúmeros idiomas, do francês e do espanhol ao russo e ao chinês.

Entre os teus livros, muitos reeditados, podemos destacar (no género romance, novela e conto):“As Aves da Madrugada”(1957)(2012),“A Noite Roxa”(1956)(1982), ”Uma Pedrada no Charco”(1957)(1998) ,“Bastardos do Sol”(1959)(1994), “Os Insubmissos” (1961) (2003), “Imitação da Felicidade” (1966) (1988), “As Pombas são Vermelhas”(1977)(1985),“Fuga Imóvel”(1982)(19929, ”Violeta e a Noite”(1991), “O Supremo Interdito”(2000), “Nunca Diremos Quem Sois”(2002),), “A Estação Dourada”(2003), ”Os Cadernos Secretos de Pior do Crato”(2007) e(último editado) a “Imensa Boca dessa Angústia e Outras Histórias”(2013). A tua última obra é “Nenhuma Vida” inédito entregue à editora, em Julho passado, para ser publicado brevemente.

VI-Exigência e coerência. Verticalidade e paixão. Insubmissão.

Há 57 anos, precisamente em Agosto de 1956,foste cobrir o conflito do Suez para o Diário de Notícias. Nunca ficaste satisfeito com as crónicas publicadas sob a alçada férrea da censura. Reunidas estas crónicas em 1999,em nota prévia, referiste essa insatisfação pelas condicionantes impostas pelo fascismo mas expressaste, mesmo assim,  “gostaria que esses capítulos viessem a ser conhecidos pelos povos árabes ”.Mais um facto a revelar a fibra de um homem que iria fazer 90 anos em Dezembro e que toda a sua vida adulta teve como objectivo acabar com a luta da exploração do homem.

Tendo passado a tua infância em Moura, no nosso Alentejo, onde coabitava a fome com as ricas famílias , como a tua, possuidora de algumas terras, nunca na tua obra e nas tuas acções olvidaste o que ali tinhas vivido e registado nesses anos. Não pode deixar de salientar-se o que tu próprio contas, a propósito da herança das propriedades familiares, numa entrevista recente, já em Setembro de 2012,a um outro jornal 

«Éramos três. O meu irmão Jorge não tinha as mesmas ideias - era um homem que se interessava fundamentalmente pelo dinheiro. Para podermos dar ao Jorge a parte dele vendemos aquilo a um primo nosso, grande agrário. Comprou se lhe garantíssemos que não lhe ocupavam as terras. Garantimos. A nossa parte, minha e do Miguel, ficou para o sindicato dos trabalhadores agrícolas do distrito de Beja. Pedi licença para tirar da minha parte uma pequena parte para ajudar a minha filha a comprar uma casa. Acharam bem. E ela comprou. Ela também está muito perto das ideias comunistas, embora não seja militante.»

Foste uma espécie de socialista cristão, como disseste, mas também é nessa mesma entrevista que nos confessas: 
«A minha primeira relação com o Alentejo é eminentemente poética. Começo a sentir a natureza apaixonadamente, como qualquer coisa de mágico. Essa relação profunda a certa altura transforma-se porque me dou conta das injustiças sociais. Das desigualdades. Enveredo por um caminho que é uma espécie de socialismo cristão….Deixo de ser …(crente)… por causa da confissão. Se me comprometo, se juro, não cometer os mesmos pecados, [sou absolvido]. E tenho de rezar umas tantas orações. Eu sei de antemão que vou cometer esses pecados... Portanto, aquilo parece-me uma farsa. E repudio completamente o catolicismo.» (…)«As primeiras ideias marxistas vêm-me do contacto com o meu primo Fernando Medina, casado com a Maria Eugénia Cunhal, que era comunista. Dá-me a ler pela primeira vez textos do Marx. Tinha talvez 13, 14 anos.»

Ainda antes de ingressares no Partido Comunista Português, o que aconteceria em 1969,estiveste em Cuba em 1962, participando num encontro de escritores solidários com a revolução cubana e no ano seguinte, em Florença presides, enquanto membro, à delegação portuguesa das Juntas de Acção Patriótica no Congresso em Defesa da Liberdade da Cultura, realizado pela Comunidade Europeia de Escritores. No mesmo ano és preso acusado de pertencer ao PCP e às Juntas de Acção Patriótica. 
Foi a primeira de três vezes que és preso e sujeito a brutais torturas pela PIDE. Há quem não te reconhecesse na magreza com que saíste de Peniche, mantendo o teu olhar doce e bondoso!

Em Cuba travas conhecimento com Fidel e Che Guevara e é sobretudo com este que crias laços profundos, na luta e na amizade. «Em 1961 vou a Cuba no momento do ataque [Baía dos Porcos] e conheço pessoalmente e travo relações de amizade com alguém que ia marcar toda a minha vida: o Che Guevara. Tivemos conversas muito interessantes, algumas, justamente, sobre poesia. (…)"A poesia de alta qualidade, mesmo quando não parece directamente ligada ao processo revolucionário, é sempre progressista. Porque a beleza em si é uma forma de progresso, de aperfeiçoamento do ser humano", disse-lhe. O Guevara deu-me esta resposta de que nunca me esqueci: "Talvez tu tenhas razão. Mas se puderem dar um jeitinho para o nosso lado, agradeço!". Isto era o Che.» (…) «Che tinha uma natureza romântica e revolucionária. E adorava as mulheres. E as mulheres adoravam o Che. Teve uma ligação no México com uma mulher mais velha, que tinha uma grande cultura marxista, e que foi quem fez dele um marxista.» (…) «Acreditava verdadeiramente no futuro do socialismo. Condenou os abusos da União Soviética quando esteve em Argel, e depois mergulhou naquela absurda guerrilha da Bolívia um pouco por causa disso. Como protesto contra o socialismo degradado. Andei por lá, ao lado do Che».

Tendo-te sido perguntado se te consideravas um D.Juan, respondes: «Nunca fui um Don Juan. Isso nunca fui, não.O Don Juan é um sedutor com o desejo do império e da sedução. Eu não fui nada disso. Era um menino bonito, tímido, que inspirava ternura nas mulheres. Essa ternura é que arrastava o acto sexual. Se quiser, [era] um Don Juan seduzido, mas não era um sedutor. O sedutor, como o Miguel de Mañara da lenda espanhola, é aquele que quer mesmo seduzir.»

 Em "Solidões em Brasa", como noutros escritos, evocas "a longa resistência dos comunistas e outros antifascistas". Falas do poder operário, da "participação dos trabalhadores na gestão desses casarões, em breve nacionalizados, de onde eram expulsos, se é que não tinham já fugido, capitalistas e serventuários da ditadura". Na mesma entrevista que temos vindo a citar foi-te perguntado:-A palavra "capitalista" tinha para si peçonha? «Tinha! [riso] Ainda tem» respondes sem hesitar.E ainda perante nova pergunta:- Falas do "veneno da insubmissão". ---Insubmissão continua a ser uma palavra central em si? O primeiro dos seus livros a ser notado foi "Os Insubmissos", respondes: «Sim, continua. O Nuno Júdice fez uma leitura muito fina e profunda do livro. Diz que é um livro cheio de novidade, até na maneira de contar.»

VII- O papel das crianças é trazer a esperança e o futuro.

Tiveste um filho aos 83 anos e falaste assim do teu menino. «Ah, o meu António. Menino com talento para a pintura, o futebol, a natação, tanta coisa. Valentíssimo. Sai a mim. Não é provocador, mas se o empurram, vai soco que ferve. Sai ao pai, eu era valente ao soco! Fartei-me de andar à pancada. Porque andei no liceu Camões no tempo da [Segunda] Guerra. Havia os alianófilos, como eu, e os germanófilos. Entre nós havia cenas de pancadaria constantes.» (…)« Mas voltando ao meu filho.Tenho um texto escrito já há um tempo que se chama "Meu António Querido, quando fizeres dez anos vais ler estas palavras. Ocupa uma folha e explica quem eu fui, como eu gostava que ele me visse e como eu gostava que ele fosse. Para já está tudo bem, excepto que eu sou benfiquista e ele não. Foi um acontecimento extraordinário ter tido o António. Se o papel das crianças é trazer a esperança e o futuro? Direi que sim.»

VIII-O neofascismo na governação actual.

Sobre o actual momento que o teu país atravessa consideravas, e bem, que o governo de Passos é neofascista. «Porque está a limitar cada vez mais o direito à greve (e encontra formas de limitação). O Passos Coelho é um indivíduo pouco escrupuloso. Não correu ainda [Set.2012] com o Relvas porque estão ligados, os dois, em negócios sujos. Insultei o Sócrates quando ele esteve no Governo. Chamei-lhe vários nomes que apareceram na Internet. Trafulha, aldrabão, bandido, etc. Hoje acho que o Sócrates, comparado com o Passos Coelho, é uma pessoa com qualidades (…). »

IX-Crítico. Incómodo. Fidelidade ideológica.

Quer a bandeira do partido comunista sobre a urna? Foi-te perguntado o ano passado. «Quero, quero, quero. Absolutamente» respondeste, depois de teres afirmado: « (…) hei-de ser comunista até ao último instante!».O entrevistador insiste. Que significa esse ritual? «É uma ideia de felicidade que só pode ser assegurada pela pureza desse instante. (Deixe-me ver se consigo explicar isto melhor...) É o momento em que tudo se cristaliza, tudo o que há de belo se reúne. É o fim do fim”.

X- Obra e exemplo imortais. Inicio ou retoma de aprendizagem.

Não amigo Urbano. Não é o fim do fim. É o início ou a retoma para todos aprendermos, ainda mais, com a tua obra e o teu exemplo. Obra e exemplo imortais para os seres humanos que verdadeiramente amarem os princípios e os valores que deram corpo e alma à tua prosa, à tua poesia, à tua luta…

XI-A Lua no chão. Um borrão lindíssimo.

Por isso nesta nossa singela homenagem de amigo e ousando repetir o que disseste sobre o papel das crianças que é o de” trazer a esperança ao mundo” achei que me perdoarás citar o escrito da tua filha Isabel, no que é doce e terno , características tão tuas, este testemunho de amor e saudade por um pai especial e porque, como tu disseste, “é lindíssimo”.
I.F.« Lembro-me de um dia, por volta dos meus 7 ou 8 anos, ter recebido como presente uma caixa de guaches de todas as cores.
O desenho nunca foi o meu forte, mas julgo que nessa altura ainda não tinha tido oportunidade de chegar a essa triste conclusão e haviam-me criado condições para montar o meu pequeno atelier no quarto da costura da enorme casa dos meus avós.
Não sei que outras obras de arte teria feito antes, mas quando entraste na sala, nesse dia, estava eu a terminar o vestido radioso de uma menina que habitava uma paisagem campestre, cheia de árvores e flores. Era minha intenção acrescentar inúmeras bolinhas brancas à sua saia rodada, mas mergulhara desordenadamente o pincel na tinta e um enorme borrão tinha caído no chão do desenho, manchando também o meu momento. Tu aproximavas-te da secretária. Era tão raro visitares-me enquanto brincava!
Rodei as cerdas do pincel em círculos rápidos e meticulosos, de aparente concentração.— Que é isso — perguntaste. — Que estás a pintar?— Uma menina — disse, sem desviar os olhos do trabalho. — Uma menina no campo.—Ah, muito bem — ias concluir já de saída, quando um meio sorriso um pouco condescendente te reteve mais um pouco.— E isto? — quiseste saber, apontando para o borrão de tinta branca que eu não parava de aumentar.— Isto é a lua — respondi.
— A lua no chão? — estranhaste.— Sim, a lua no chão.
O teu rosto tornou-se então grave. Sério. — A lua no chão — repetiste.— Mas isso é lindíssimo! — e saíste triunfante, a folha de papel almaço entre as mãos, declarando naquele teu tom de voz quase em contralto que termina num murmúrio de verdadeiro êxtase:— Isto revela um imenso sentido poético! Dias depois o meu «quadro» surgia emoldurado. Andou por essa casa durante anos e anos. «A tua lua no chão» como sempre lhe chamaste. Ainda hoje penso muitas vezes se as coisas belas o têm de ser obrigatoriamente à partida — enquanto ideia, elemento estético — ou se podem construir-se no material dos erros, dos borrões, rodando as cerdas dos afectos em longos círculos de tinta branca. Criando luas. Julgo que sim. Mas julgo também que, para que tal aconteça, é necessário que alguém, alguma vez, tenha sido capaz de olhar para o nosso trágico engano, para a nossa pinta derramada do vestido, emoldurá-lo, dar-lhe um pedacinho de parede e murmurar nesse exagero alquímico dos afectos  “Isto é lindíssimo!”
 Eu tive essa sorte.» ( Isabel Fraga/tua filha)
A lua,de facto, está sempre no chão do céu...e nele passa um velho homem a cumprir a sua sentença divina...levar um fardo de lenha às costas...como bem se vê nas luas cheias... É um singelo desabafo meu, de choro contido e nó seco na garganta, meu querido Urbano.

XII- “Foste sempre aquele/ que nos mostrou/a urgência do sonho…e a liberdade”

E para terminar , por ora, partilho também, da lutadora e amiga comum, os versos que M.Tereza Horta te dedicou na tua partida:
«Foste sempre aquele/ que nos mostrou/a urgência do sonho/
O gesto solidário/o valor da palavra
Falavas de honra e amizade/
Contigo aprendemos/ a coragem/
Meu amigo de luta /e liberdade 

XIII-O Dia Último e o Primeiro. Nenhuma Vida

«Há borboletas imóveis no colo da tarde. São promessas. Jovens altivos e duros, meia dúzia deles, parecem dizer, à maneira do Cristo da Justiça: não é a paz que vamos empunhar, mas a espada, a espada das nossas queixas, das nossas aspirações, de todos os sonhos que sufocámos.Aprende, rapariga que passas, bonita mas constrangida. O próprio ar te deseja e te força a baixar os olhos. Levanta-os, aprende a imensidão deste dia.»…[ em “O Dia Último e O Primeiro(1999)]
«Daqui me vou despedindo, pouco a pouco, lutando com a minha angústia e vencendo-a,dizendo um maravilhoso adeus à água fresca do mar e dos rios onde nadei,ao perfume das flores e das crianças, e à beleza das mulheres.»    [do prefácio do teu ultimo livro a editar:”Nenhuma Vida”]

Sabemos como, na tua vida, te marcou o AMOR na criação e perca.
Mas nessas lutas-com derrotas e vitórias- foste sempre de corpo inteiro. É aí que, na nossa memória, tu-Amigo Urbano-ascendes à eternidade e à imortalidade. Na memória dos que quiseste que fossem teus queridos e teus amigos, na memória das tuas acções e da tua obra, no desempenho pelo cimentar do nosso Abril da Liberdade.
Todos deixaremos de estar cá. Que essa falta possa ser compensada, como no teu caso, pelas sementes que deram fruto. Pelas sementes que deixas para sempre, as do teu génio e trabalho, da tua doçura e afectividade e as do teu firme caráter e verticalidade, as de quereres um mundo melhor, mais solidário e verdadeiramente humano.
Ficamos mais pobres sem ti.Ficaremos mais ricos com a memória do teu estatuto e estatura, de ti e da tua obra.
Foi bom ter-te. Será bom manter-te entre nós. Os teus capitães de Abril e toda a gente de Abril te manterão vivo. Manteremos
Até já, Urbano amigo…

Manuel Duran Clemente 
(10 de Agosto de 2013)